Era o avanço do Outono que dava às árvores, aos arbustos, a toda
a folhagem circum vizinha, o tom de perenidade que as aproximava
das coisas transformadas. O que constituía o mobiliário, o interior da casa.
Havia vertentes de mel no pousio de cada olhar.
Para além do despir das árvores, do adormecer da seiva, havia mudo grito
de beleza, como se sono a que a Natureza se preparava, trouxesse imagens
descontinuas entre
estar ,nao estar, ser, não ser
Amarelos de inicio de Primavera acenavam entre vermelhos, a fugir para castanho,
a perder-se ainda nos verdes persistentes.
O verde escuro ponteando nas coníferas, mantinha a constância,
o elo. Memória de estações. O chão luminoso embaíra-se agora na poeira branca,
chegada no frio que nós afasta do actual colorido do céu. Ramos inquietos acenam a nudez transparente.
Nao fosse o troar de comboios a rasgar a paisagem, tudo em volta poderia pertencer a outra época, outro século. A qualquer século da milenar historia do planeta.
O comboio em traço agressivo, trouxe-me à realidade do motor.
Do petróleo, do gaz, da gasolina. Às fábricas, tubos de escape,
às bombas pressurizadas, ao século dos séculos. De grandes invenções de descobertas.
Ao que foi durante tantos anos a maneira de olhar a vida ocidental, a arte a poesia.
Século das grandes revoluções. Evoluções que tornaram o homem senhor de quanto existe. Que o mergulharam nós elementos, nele próprio. Conhecimento aprofundado quotidianamente.
O ruído vai-se afastando. Serena o pensamento. Voltam os olhos às árvores, à
paisagem. Mas dentro de mim sobe voz desconhecida.
Vinda talvez do interior da seiva. Ou dos abissos. Vinda de espaço desconhecido; voz sem historia intranquila por conseguinte. Tento traze-la até ao perceptível.
No grito do corvo poisado no posto eléctrico chega-me a duvida do futuro.
O que serão as árvores amanhã?
O que seremos nós?
Mutantes a atravessar o espaço até encontrar o tempo de que compreensão?
Marília Gonçalves
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