A cal escorria-me dos olhos azuis de tanto céu e
transformava-se em manchas doiradas ao poisar no chão. O verde dos
vinhedos coloria-me o vestido e mesmo as mãos lembravam acenos da
paisagem. A terra tisnada num reflexo de tempo, de sol, abria-se à
procura de ar ou de agua que mais abaixo murmurava suave. Ribeiro,
não,não era. Antes uma fita ondulante e musical a refrescar a tarde,
rasgada apenas pelo som das cigarras. Pássaros não os havia àquela hora
de calor. Perto da pequena nascente o zumbido atordoante das abelhas,
numa reincidência de mel.
Foi há muitos anos, tão longe daqui. Quase duvido ter sido eu a presenciar tal imagem da vida.
Não
uso vestido rodado nem rodopio a cantar, mas sei que dentro de mim
existe ainda, embora não saiba bem onde, essa que nos dias meninos olhou
e viu.
Marília Gonçalves