
MENINA
O BLOGUE UNIVERSAL E INTERNACIONALISTA
A praça é do povo. Como o céu é do condor. É o antro onde a liberdade. Cria águias em seu calor! ...
A palavra! Vós roubais-la
Aos lábios da multidão
Dizeis, senhores, à lava
Que não rompa do vulcão.
Castro Alves
Jornal de Poesia
Deus! Ó Deus! Onde estás que não respondes? / Em que mundo, em que estrelas tu te escondes / Embuçado nos céus? /Há dois mil anos te mandei meu grito / Que, embalde, desde então corre o infinito... / Onde estás, Senhor Deus?
Castro Alves
Albert Einstein
Perguntas Com Resposta à Espera
Quem Acode à Tragédia de Portugal Vendido ao Poder dos Financeiros?! Quem Senão TU, POVO DE PORTUGAL?! Do Mundo inteiro a irmã de Portugal a filha. Marília Gonçalves a todos os falsos saudosistas lamurientos, que dizem (porque nem sabem do que falam) apreciar salazar como grande vulto,quero apenas a esses,dizer-lhes que não prestam! porque erguem seus sonhos sobre alicerces de sofrimento, do Povo a que pertencem e que tanto sofreu às mãos desse ditador!sobre o sofrimento duma geração de jovens ( a que vocês graças ao 25 de Abril escaparam)enviada para a guerra, tropeçar no horror e esbarrar na morte, sua e de outros a cada passo! sobre o sofrimento enfim de Portugal, que é vossa história, espoliado de bens e de gentes, tendo de fugir para terras de outros para poder sobreviver, enquanto Portugal ao abandono,via secar-se-lhe o pobre chão, sem braços que o dignificassem! Tudo isso foi salazar, servido por seus esbirros e por uma corte de bufos e de vendidos, que não olhavam a meios,para atingir seus malévolos fins!Construam se dentro de vós há sangue de gente, vossos sonhos, com base na realidade e não apoiando-os sobre mitos apodrecidos, no sangue de inocentes!!! Marília Gonçalves (pois é! feras não têm maiúscula!!!)
domingo, 29 de setembro de 2024
velha praia
o olhar cheio de tempo
num murmúrio musical
harpejos lentos de vento
sumo do sol roseiral
mãos aladas gota a gota
esvoaçam sombra do dia
praia perdida gaivota
a marulhar poesia
véu azul desce do templo
onde se perdem os gestos
repetido movimento
passos lestos
escorrem dias como lágrima
pérololas d'agua vertida
desdobrar múltiplas páginas
sempre na história caída
cintilam escamas movendo
vago do azul perdido
soa em metáfora O tempo
a velha praia incendida.
Marilia Gonçalves
À fleur de l’eau
À fleur de l’eau, la lagune improvise maintes tonalités. Le matin vient d’éclore. De la nuit subsistent d’étranges références aux bleus qui se dissipent peu à peu.
Le soleil prisonnier de l’aube lance au loin de lumineuses promesses. Nuances vagues qui s’entremêlent aux obscurités fugitives. La lagune est un nid. De parfums, de mouvements, de sons, de vie. Elle emmène au loin nos yeux, les entrainant dans ses courants à marée changeante.
Feu, or, diluent l’étain initial. Nos yeux suivent l’envol aquatique d’où rêves et jours s’échappent.
Nous récupérons par la mémoire, par l’affectivité, le regard qui s’enfuit au loin. Les mots sont musique, couleur.
L’eau en une seconde nous convie au voyage initiatique de nos sens. Des profondeurs salées, réminiscence d’anciens pleurs, s’élèvent la magie authentique, puissante de la vie.
Le clapotis léger ajoute à cette partition de notes graves, d’instrument lointain à la recherche de sa finalité.Lagune aux remous qui éveillent mythes et légendes traversées par le temps dans la mémoire des voiliers perdus. Sommeil que l’imagination seule touche de son souffle. Prolongement infini d’étrangetés ou tels les éléments, le sang de l’histoire s’éveille à la mémoire du temps passé.
Marilia Gonçalves
a dançar no templo
Na grade do tempo
fecharam as horas
a dançar no templo
das cem mil demoras.
No templo vestias
envoltas em véus
por trás dos portais
não olham os céus.
Livres lá fora
murmuram as selvas
do chão traiçoeiro
ao cimo às alturas
há vida aos roldões
animais e ervas
orvalho, frescuras.
Por dentro do templo
dos portais fechados
há danças oferendas
a deuses calados.
Marília Gonçalves
Eu posso dizer que não me importa
Faro 1985
Eu posso dizer que não me importa
as tuas descrenças, a tua desconfiança
posso dizer até que nada me magoa
mas eu sou como as crianças
preciso de ternura de carinho
de suavidade, por isso tudo quanto é áspero
tudo quanto fere tudo o que foi criado
para matar o que há de bom em nós
não o aceito!
de nada serve dizer que não me dói
porque minha alma sangra.
Marília Gonçalves
EGOCENTRISMO 1985
Paisagem tua
Que tempestade mora dentro de ti
que nem sabes reconhecer o dia
de sol
o que sabes das ondas
que há no mar do rochedo
dos areais dum barco
que sabes das mulheres que esperam
o pescador que partiu
ou da que viu partir para a guerra
o que foi sim
mas sem querer ir
Sabes sim sabes
sabes sem saber
ao de leve
mas por dentro de ti ignoras
conheces paisagens, sabes
o que é o luar sabes falar deles
sabes deram-te prazer
mas nunca te preocupaste
com eles nunca acrescentaste
uma nota ao canto duma ave
recebeste a ave cantava
tu ouviste cantar
embriagaste-te em seu canto
mas não criaste nada
nada fizeste para o cantar da ave
ser mais belo
as árvores eram frondosas
saboreaste a sua sombra
mas não alteraste nada do que estava
aproveitaste sempre
usufruíste integraste a paisagem
ou simplesmente a aproveitaste
ma nada lhe deste de concreto
não a regaste com teu pranto
não lhe deste um esforço
um soluço
nem lhe deste teu espanto
quando te voltas para trás
é de ti que tens saudade
mas nunca lembras
o que não fizeste
gesto esquecido
que não chegou a ser
e que hoje teimosamente
na tua cegueira constante
continuas a ignorar
a desrespeitar.
Marília Gonçalves
Contradição O NOME DA MALDADE
POEMA DE AGOSTO DE 1985 FARO
O NOME DA MALDADE
Eu não acredito na maldade
eu sei que há pessoas
que fazem mal
sei que há ódios e guerras
mesquinhez e incompreensão
sei que os dicionários
estão cheios de palavras
que sendo diferentes
se aproximam muito
umas das outras
todas elas redundam em falta de amor
mas é inacreditável
que o amor possa transformar-se em ódio
que o próprio amor
possa gerar incompreensão
era como se o sol
fosse fonte de escuridão
isso eu não compreendo
nao compreendo que o gesto
seja tomado por ausência de gesto
que o olhar seja cegueira
e que a voz que se levanta
seja insultada
não compreendo
o que vai dentro das pessoas
que acreditam na maldade
a maldade não existe
existe ignorância
que me importa
que me importa que falem
de lobos de cordeiros
eu não sou cordeiro
nem sou lobo
eu sou o ser humano
e vou pela vida fora
e na minha vida
há muitas vezes pedras
aonde eu tropeço
que me magoam me rasgam
mas continuo a ser
o Ser humano
nunca acreditarei na maldade
que me rasguem as pedras todas do mundo
eu continuarei a ser eu
o Ser Humano
não nasceu para a maldade
e ainda quadro a veja
quando a sinta
eu, para ela conheço
sempre o mesmo nome
ignorância.
Talvez por essas razões
ou por falta delas, não perdoo.
Marília Gonçalves
pra quê
Para Quê
Pra quê falar de ti, se não mais tu
pra quê dizer agora, se não já
pra quê falar de mim sem coração
pra quê dizer sempre, se mais não?
Pra quê dizer connosco, se não nós
pra quê dizer juntos, se tão sós
pra quê dizer falarmos, se não voz?
Pra quê, pra quê, pra quê, se não é nada
se no sorriso começa cada história
para vir a ser silenciada.
Marília Gonçalves
Grito branco no azul
Grito branco no azul
Faro cidade de mar
moura encantada do sul
da ria de ardente olhar.
Vontade de transparência
desejo, fúria bravia
ímpeto d’oiro, veemência
bela cidade algarvia.
Faro dos dias que foram
e não voltam nunca mais
de saudades que em mim choram
amargos prantos e ais.
Quando de ti me afastei
menina ainda sorria
quem sabe se voltarei
a ver-te como te via.
Marília Gonçalves
CONTO uma mulher meditava.
Sentada sobre tronco de velho castanheiro, uma mulher meditava. A tarde amena daquele outono tinha no cheiro a húmus todas as tonalidades da estação adiantada. Cogumelos de várias espécies davam ao chão a graça, o colorido de estampas antigas.
Brilhava-lhe o gosto contemplativo no olhar, mas na expressão, havia uma contrariedade que o aspecto grave da postura confirmava. Que contraste se adivinhava entre a observação da floresta e seu mundo interior.
Na quietude da floresta deixou escapar uma frase:
_como é difícil ser poeta!
Lembrou o poema de Florbela Espanca, ser poeta é ser maior...
Maior, mas maior que quê?
Maior, que a dimensão humana? talvez.
Porque havia de ser maior o poeta, que tudo o que o gerou. O ser humano atravessou a história milenar, seus sobressaltos e incertezas... que pode haver de maior que essa realidade. Talvez o sonho, o sonho humano seja maior. E quem se eleva mais no sonho que o poeta? Será isso ser maior? poderemos medir-nos com nossos sonhos, que eles sim são livres. Nossas peias humanas permitem-nos por acaso liberdade? Pobres rimadores à procura de sentido. De novo sua voz se fez ouvir:
_como é difícil ser poeta! Mas onde está afinal a dificuldade em sermos o que somos. Ser poeta, fazedor de rimas, ajuntador de palavras, à procura de sentido! Se ao menos ser poeta fosse assim simples, não teria por dentro aquela pontada aguda a exprimir o doloroso contrário: estar na posse de sentido à procura de palavras.
E se ainda ao menos fosse só isso. Mas não, ainda era preciso não desmerecer e sentido e palavras.
Na altura dos ramos aves cantavam.
_Que sorte vocês têm! Nascem, trazem o cantar por destino, sem metafísica alguma, sai-vos certinho o canto determinado desde avôs, nenhuma nota houve a mudar, vossas incansáveis harmonias perfumam-nos os ares infatigavelmente. Regras naturais que sempre encantam sem trazer reflexo de dúvida e angústia. Isto de nascer com consciência, sempre tem que se lhe diga.
A harmonia do poeta tem que começar por dentro, ou terá sido por acaso que o Rimbaud tenha deixado de escrever versos e se tenha tornado traficante de armas. Poeta nunca o poderia ter feito. Para passar ao estado mercantil, despiu a poesia de que estava vestido por dentro. Dinheiro e poesia nada têm em comum.
_Pobre homem pensou, depois do despudor da poesia, despir a alma de poeta.
E dizem que os poetas não passam de uns loucos, de líricos. Falam por falar, nada sabem do rigor a que a poesia impele.
Senão, ser poeta seria fácil. Dizem que se nasce poeta.
Como falariam de qualquer deficiência. Mas para que espontâneos versos brotem, é preciso que a idealidade conduza o poeta pela mão, alma de criança, dotada visão a agudizar-se sempre.
Marília Gonçalves