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O BLOGUE UNIVERSAL E INTERNACIONALISTA


A praça é do povo. Como o céu é do condor. É o antro onde a liberdade. Cria águias em seu calor! ...

A palavra! Vós roubais-la
Aos lábios da multidão
Dizeis, senhores, à lava
Que não rompa do vulcão.

Castro Alves
Jornal de Poesia

Deus! Ó Deus! Onde estás que não respondes? / Em que mundo, em que estrelas tu te escondes / Embuçado nos céus? /Há dois mil anos te mandei meu grito / Que, embalde, desde então corre o infinito... / Onde estás, Senhor Deus?

Castro Alves


MINHA LEI E MINHA REGRA HUMANA: AS PRIORIDADES.

Marília Gonçalves

Grandes almas sempre encontraram forte oposição de mentes medíocres.
Albert Einstein

Perguntas Com Resposta à Espera

Portugal ChamaS e Não Ouvem a Urgência de Teu Grito? Portugal em que http://www.blogger.com/img/gl.bold.gifinevitavelmente se incluem os que votando certo, viram resvalar de suas mãos a luz em que acreditavam; A LUTA CONTINUA )
Quem Acode à Tragédia de Portugal Vendido ao Poder dos Financeiros?! Quem Senão TU, POVO DE PORTUGAL?! Do Mundo inteiro a irmã de Portugal a filha. Marília Gonçalves a todos os falsos saudosistas lamurientos, que dizem (porque nem sabem do que falam) apreciar salazar como grande vulto,quero apenas a esses,dizer-lhes que não prestam! porque erguem seus sonhos sobre alicerces de sofrimento, do Povo a que pertencem e que tanto sofreu às mãos desse ditador!sobre o sofrimento duma geração de jovens ( a que vocês graças ao 25 de Abril escaparam)enviada para a guerra, tropeçar no horror e esbarrar na morte, sua e de outros a cada passo! sobre o sofrimento enfim de Portugal, que é vossa história, espoliado de bens e de gentes, tendo de fugir para terras de outros para poder sobreviver, enquanto Portugal ao abandono,via secar-se-lhe o pobre chão, sem braços que o dignificassem! Tudo isso foi salazar, servido por seus esbirros e por uma corte de bufos e de vendidos, que não olhavam a meios,para atingir seus malévolos fins!Construam se dentro de vós há sangue de gente, vossos sonhos, com base na realidade e não apoiando-os sobre mitos apodrecidos, no sangue de inocentes!!! Marília Gonçalves (pois é! feras não têm maiúscula!!!)

terça-feira, 17 de setembro de 2024

Karl Marx

 

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+ 

Rodeia-te de pessoas que te façam feliz. Das pessoas que te fazem rir e que te ajudam quando precisas. Das pessoas que realmente se preocupam. Elas são as que valem a pena ter na tua vida. Todos os outros estão de passagem.

-Karl Marx

Aula 160 – Olha, Marília, as flautas dos pastores (Bocage)

AULA 25 | REALISMO (Estilo de Época) | PROF. JORGE MIGUEL

AULA 24 | ROMANTISMO: CASTRO ALVES (Estilo de Época) | PROF. JORGE MIGUEL

CASTRO ALVES-JORGE AMADO-TE EMBALAREI COM UMA CANÇÃO SENTIDA.wmv

Jorge Amado (1/2) - De Lá Pra Cá - 29/05/2011

Jorge Amado (2/2) - De Lá Pra Cá - 29/05/2011

ABC DE CASTRO ALVES (1941) - JORGE AMADO | BODEGA DO AMADO - TEMPORADA I

Tus Ojos Me Recuerdan AO RUI

SOBRE CASTRO ALVES

 SOBRE CASTRO ALVES

 


 

Léon Tolstoï

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A portuguesa que encantou e apaixonou poetas e intelectuais brasileiros!...

A atriz portuguesa e o maior génio literário do Brasil. Uma história de ...AMOR

Castro Alves - A Duas Flores

povos de mão na mão. PAZ

 

O valor duma diferença

tem tido o preço da paz

por cada um ver ofensa

em tudo o que o outro faz.

 

Só por desconhecimento

tanta vida se perdeu!

Tanta dor e sofrimento

tanta lágrima correu!

 

O verdadeiro caminho

que leva à fraternidade

é vermos cada vizinho

igual em dignidade.

 

Quando a distancia é maior

vencer a ignorância

será olharmos melhor

sem medo nem relutância.

 

Ver na cultura diferente

um direito a respeitar

deitando à terá a semente

que breve irá germinar.

 

Uma árvore de amor

de terna compreensão

fará o mundo melhor

- os povos de mão na mão.

 

 

 

Mas se a força persistir

cruel d’obscurantismo

nosso mundo irá ruir

no maior cataclismo.

 

 

 

 


 

 

 

 

A porta bateu? Ou bateram à porta? Marília Gonçalves









A porta bateu? Ou bateram à porta? Quando a porta bate é porque há corrente de ar. E quando batem à porta qual é a ideia corrente? São ladrões. Não de portas. E nem os ladrões batem à porta nem as portas batem nos ladrões. E a porta tem corrente. Mas não corre, porque se corresse a porta não era porta, era corredor. E o corredor nunca fica à porta. Entra sempre.


Ou sai. Mas quando sai, sai a correr. Quando entra, não. Entra só corredor e nós às vezes é que corremos para entrar. E Saímos pela porta que bate antes antes dela bater porque senão pode bater-nos a nós. E ficávamos sem a voz com o susto. Porque se ficássemos com o susto e com a voz não se diria de nós que foi a porta que nos bateu por causa da corrente de ar. Podia dizer-se que o ar nos deu e fomos bater à porta.;


A porta bateu? Ou bateram à porta? A culpa foi do ar que não faltou. Se o ar faltasse não havia corrente e o corredor não saia a correr nem entrava a porta porque lhe faltava o ar.


Assim a culpa é do ar se a porta não bateu nos ladrões que não bateram à porta. Entao porque diabo é que a porta bateu?




Marília Gonçalves





poemas à solta















Olhos de trigo a voar


sobre a miséria e a fome


sem saberem germinar


entre as mãos de quem não come


espanto de sonhar o pão


ou ser leite maternal


transformar-se em coração


num mundo sem ideal!


sonho de trigo, campina


futura seara ao vento


pr'a levantar mais acima


o amor e o pensamento.






Marília










Vem da memória do tempo


o gesto do meu dizer


e cai ao bafo do vento


a certeza do meu ser




vem da distância perdida


o olhar que espanto tem


dentro em mim trago perdida


história que da história vem.






Marília








Nas mãos que trabalham


há mil gestos que se repetem


e continuamente


vão transformar o mundo


na forma desconhecida


experimental




Marília




















Menino da Beira Mar






Menino da beira-mar


de búzio na mão estendida


que mundos no teu olhar


que luz, que sombra, que vida.




Chegas o búzio ao ouvido


atento escutas o mar


menino de olhar perdido


estás vivo, sabes sonhar.




Caminhando pela praia


ágil em total nudez


levas a cabeça cheia


de contos. Era uma vez...




Menino da beira-mar



partilha o búzio comigo


vamos lutar contra a mágoas


meu menino, meu amigo.







Marília










Numa lágrima aprofundo


os teus olhos e o mundo




há na lágrima infantil


uma sonda universal:


ver chuva no céu de anil


não é decerto normal






quando a lágrima reflete


mais do que o passo aprendido


e que a criança repete


mesmo que tenha caído






Quando há o mar infinito


que atravessou tantos sóis


que os olhos dum pequenito


trinam mortos rouxinois




Ah! Então ó maravilha


deste vil deslumbramento


na lágrima minha filha


desagua o pensamento




Marília




Grita


a escuridão


que trazes dentro de ti


grita


os cálidos dias que não voltam


os pássaros emudecidos que não cantam


as fontes entorpecidas que não correm


as manhãs adormecidas que não nascem


as noites que habitam o teu espanto


os silêncios que te calam a dor


Grita! Grita! Grita:


por esse so que em ti se está a pôr....


Grita o grito mudo dos dias que não correm


e escuta o eco do silêncio:


os pardais cantam indiferentes


ao teu sofrimento sem luar...


as fontes gorjeiam sóis a saltitar


as noites tropeçam nas estrelas


o eco não captou a tua dor!?


Na estagnação do insuportável


tudo continua à tua volta




Marília






Provemos aos mortos que não os traímos


devolvendo aos vivos a terra dos vivos.




Sidónio Muralha




O assobio do comboio


o assobio da menina


o assobio da cafeteira


o assobio do ardina


o assobio do vendaval


o assobio da serpente


o assobio de quem passa


na angustia que há na gente.




Marília






A porta bateu? Ou bateram à porta? Quando a porta bate é porque há corrente de ar. E quando batem à porta qual é a ideia corrente? São ladrões. Não de portas. E nem os ladrões batem à porta nem as portas batem nos ladrões. E a porta tem corrente. Mas não corre, porque se corresse a porta não era porta, era corredor. E o corredor nunca fica à porta. Entra sempre.


Ou sai. Mas quando sai, sai a correr. Quando entra, não. Entra só corredor e nós às vezes é que corremos para entrar. E Saímos pela porta que bate antes antes dela bater porque senão pode bater-nos a nós. E ficávamos sem a voz com o susto. Porque se ficássemos com o susto e com a voz não se diria de nós que foi a porta que nos bateu por causa da corrente de ar. Podia dizer-se que o ar nos deu e fomos bater à porta.;


A porta bateu? Ou bateram à porta? A culpa foi do ar que não faltou. Se o ar faltasse não havia corrente e o corredor não saia a correr nem entrava a porta porque lhe faltava o ar.


Assim a culpa é do ar se a porta não bateu nos ladrões que não bateram à porta. Entao porque diabo é que a porta bateu?




Marília
















A cal esqueceu o azul


e a folha emurcheceu


o norte abraçou o sul


choveu.


Irisou-se a pedra informe


ou dividiu-se ou cresceu


a transformar esta fome


no ser dúbio que sou eu.




Marília


















A dor não é colorida


não tem peso não tem voz


por isso não há medida


pró que trazemos em nós




Marília










o lume é que dá à treva


pétalas a florescer


lágrimas azuis que tecem


os meus braços de mulher




Marília








vindo do tempo


dos templos


do alabastro


amadis


alagou


de branco véu


o álamo


onde a alba


aleava


encantos


tantos


que o enluarado


damo


de dardo


sanguinolento


na anémona sombria


entoa sons de alude


num sobressalto de adaga.


Ó amadis


quem te diz


que é raiz


o dardo teu?


semente ou lume


ou navio


alado será o rio


do teu desejo amadis


será o dardo o alento


no teu dúbio movimento


mas não fará o que diz








































































































A Poesia como Necessidade Interior Revelações da poetisa Marília Gonçalves












A Poesia como

Necessidade Interior Revelações da poetisa

Marília Gonçalves

Declarações recolhidas por D. Lacerda

Marília Gonçalves é uma das vozes poéticas mais vibran tes e puras que conhecemos




entre os portugueses de França.




Achando-se desde muito jovem, por relações de família,




envolvida na luta pela emancipação das camadas sociais desprotegidas,




os seus versos são portadores de rebeldia e de anseio de justiça.




O seu espírito solidário e universalista envolvem-na nos movimentos colectivos




e emprestam à sua poesia um forte élan expansivo e comu nicante que nos empolga,




“entrando em nós luminosa e potente”, como diz a poetisa.




Registamos aqui algumas das suas vivências e impressões que ajudarão




a melhor desenhar o seu universo poético.






Latitudes — Quando começou a escrever poesia a sério e em que circunstâncias?

Marília Gonçalves — Engraçado, pois, na verdade, nada tenho dessa época infantil




dos primeiros versos. Aliás tudo o que escrevi, tal como tudo o que encheu minha infância




, ficou na Amadora quando vim para aqui. Viemos quando tinha catorze anos; a casa foi desfeita -




o interior entenda-se - cerca de dois anos depois e nada mais tornei a ver,




mas os primeiros versos foram escritos a respeito de meu nome, aos dez anos.

Quanto a poesia a sério, partindo do princípio que o termo quer dizer o que parece,




só muito mais tarde depois de desbravar, sentir e pensar as palavras




, isto quando o tempo começou a pertencer-me um pouco aí é que me




que me dediquei verdadeiramente a escrever.

Latitudes — Qual a finalidade de se instalar em França?

M. G.— Finalidade não sei, mas o motivo esse foi da primeira vez




em menina o fazer frente às adversida des surgidas com a prisão política de meu pai e o despedimento do







Marília Gonçalves, 2006.

n° 27 - septembre 2006LATITUDES 83


A praça! A praça é do povo Como o céu é do condor

É o antro onde a liberdade Cria águias em seu calor! ... ... ...

A palavra! Vós roubais-la Aos lábios da multidão

Dizeis, senhores, à lava

Que não rompa do vulcão. Mas qu’infâmia! Ai, velha Roma, Ai cidade de Vendoma,

Ai mundos de cem heróis, Dizei, cidades de pedra,

Onde a liberdade medra

Do porvir aos arrebóis.

Irmão da terra da América, Filhos do solo da cruz,

Erguei as frontes altivas,

Bebei torrentes de luz...

Ai! Soberba populaça,

Dos nossos velhos Catões,

Lançai um protesto, ó povo, Protesto que o mundo novo Manda aos tronos e às nações.

Castro Alves

Alento

Névoa azul

Ou céu cinzento

Veludo por inventar

Na ascensão de poetas

às estrelas a boiar.

Nuvem de sonho miragem paraíso por escrever...

A força é termos coragem

Da coragem nos doer.

Marília Gonçalves

Lisboa tem olhos verdes

Que incolor pássaro trouxe Das arestas da poeira

Descoberta no instante.

Os olhos escureceram

Depois tornaram-se azuis De vozes que nos ficaram

Entre poemas perdidos.

O som distante do cravo

Entreaberta janela

Onde se imprimem as pautas De palavras que se perdem.

emprego que dela resultou, com todas as consequências que advie ram.

Da segunda vez tinha vinte e nove anos (já dobrei esse cabo)




por moti vos de saúde de meu filho, tinha visto os médicos aqui operarem




“milagres” no que respeitava ao meu pai, e confiava plenamente




no sistema social francês e na medi cina aqui praticada.

A na transformação da sociedade, pela maneira como penetram e tocam as




sensibilidades de cada um. Vejamos este excerto de O Povo ao Poder (ver ao lado).

Latitudes — Como viveu o período salazarista?

M. G. — Vivi-o como filha e fami liar de presos políticos, num meio esclarecido




politicamente, sabendo donde vinham os golpes, com total conhecimento




dessa realidade o que me permitiu ser uma jovem equilibrada e sem malquerer outro que não fosse aos causadores do sofrimento que afligia Portugal e o seu povo, e de que os meus iam sendo vítimas, meu pai, o avô que me criou, preso vinte e quatro vezes, com tudo que daí resulta, meu tio assassinado pela Pide, o “Alex”. Minha tia tinha, seis meses antes, perdido o filho pequeno e matavam-lhe ainda o marido, o companheiro.


84 LATITUDES n° 27 - septembre 2006


Com todas as peripécias que habi taram a minha jovem vida




, e que fazem parte da história da resistên cia ao fascismo, histórias tão dolo rosas, tão complexas,




não cabe aqui, no espaço duma entrevista, desenvolver o detalhado




de tais acontecimentos que, pela sua gravi dade, merecem o maior respeito ao ser narrados.

Quando aos dezasseis anos come cei a militar no bidonville de Saint Denis




foi com espírito solidário que comecei a dar lições de francês aos desertores




que chegavam. Porque se insurgiam contra duas das formas de opressão




que mais me perse guiam e aos meus, aos amigos, aos direitos do ser humano:




o fascismo e o colonialismo. Continuava presente Castro Alves.




Mesmo na voz de outros poetas o encontrava. Nesse período do exílio de meu pai,




dizia aqui por Paris a Maldição de Jaime Cortesão. Assim aos dezassete disse também




Catarina de Vicente Campinas e quadras do António Aleixo, entre outros.




A poesia era a mais bela de todas as armas contra o mais hediondo regime.




Que matava em Portugal no solo de Portugal às ocultas, hipocritamente,




com a falsi dade peculiar do salazarismo .Que matava além-Mar os negros filhos




africanos no solo próprio e para onde eram levados os filhos de Portugal




, tão jovens, obrigados a morrer ou a matar sem bem sabe rem porquê.

Mas, voltando às repercussões do fascismo sobre a minha vida, sabe, quando




o Notícias da Amadora1 foi criado, eu estava a assistir de muito




perto à sua criação já que o seu fundador foi precisamente um desses




poetas a que me referi ante riormente. Andei mesmo pela Amadora a distribuir




prospectos sobre o lançamento do jornal em Outubro de 1958.




Talvez influen ciada por esse acontecimento, tentei com onze




anos criar um jornal no Externato onde estudava.

Nada tinha o coitado de subversivo a não ser precisamente o facto de ser jornal,




mas a autorização foi-me negada. A directora disse-me que a Mocidade Portuguesa




não aprovava a criação do dito. Penso que a direc tora nunca teria feito oposição; pois

chegou mesmo a levar um repórter da rádio à escola onde eu disse e gravei




O menino de sua Mãe de Fernando Pessoa.

Nem sempre foi fácil, foi mesmo doloroso interromper a escolari dade,




mas a vida mandava e o caminho era sobreviver e com dignidade. Por vezes as lições da vida são fonte de autoconfiança, pois o certo é que a partir daí soube que pelo trabalho se vencem obstá culos; a menina tinha uma esplên dida chave ao seu alcance. Descobri, aos catorze anos, talvez prematura mente mas de modo definitivo, o valor do trabalho e a dimensão do esforço.

Latitudes — Como encara a adap tação dos seus poemas à música,




pois sabemos que possui alguns que obtiveram sucesso?

M. G.— É verdade que, para além da poesia que escrevo por impe




riosa necessidade interior, tenho escrito também poemas-letras de canções, que




o compositor Arlindo de Carvalho musicou.

São poemas escritos por medida adaptando a forma a surgir à música presente;




comigo tem sido assim. É uma outra forma de escrever visto que parto de músicas




já compostas, para a construção do poema, pelo que devo obedecer a ritmos, métrica




, tónicas e átonas essencial mente.

Quanto a êxitos possíveis de canções devem-se ao factor miste rioso que faz que umaù




canção seja melhor aceite que outra. Para além disso há a universalidade da Lingua




gem que é a música já que todos os povos, em qualquer ponto do mundo, a podem compreender.

Latitudes — Sabemos que colabo rou nas rádio-livres e que tem dado recitais.




O que a move a esse contacto poético com o público?

M. G. — Para além da indispensá vel expressão poética, a musicali




dade da palavra dita e o grito de revolta, penso que deve ter sido




raro dizer em púbico poemas outros que esses que apelam para o despertar




da colectiva consciência. Ou que apontam uma maneira de ver e de reflectir realidades, que

É no traço rectilíneo

De inventar gestos de fumo Que os olhos tornam-se verdes A neutralizar o rumo.

Esboço ténue da ideia

Onde a palavra perverte

O fundo negro que ondeia Na vertical da maré.

Há olhares que dissimulam Harpejo esférica estrela

Mas dentro deles procuram A circular forma branca.

Lisboa tem olhos verdes

Numa ode giratória

Afunda-se sol azul

A perfilar a memória.

Mas quando a sombra descai Na cidade que é mulher

Há o grito lancinante

Duma criança a nascer.

Marília Gonçalves

Vem!...

Poeta meu irmão

do mundo inteiro

está a sombra a doer

Tu és o companheiro

de múltiplo segredo

por colher.

Poeta meu irmão

põe-te a caminho.

há uma encruzilhada...

É preciso vir devagarinho Surpreender a estrada.

Poeta meu irmão

irmão de todos

De todos os poetas

por nascer

Há à nossa volta

hirsutos lobos

Querem comer.

Poeta meu irmão

e companheiro

de horas amargas...

Vamos rasgar no nevoeiro Estradas mais largas.

Poeta meu irmão

O ser humano


n° 27 - septembre 2006 LATITUDES 85


pede passagem

Vamos num verso

a todo o pano

dar-lhe coragem.

Vem!

Poeta meu irmão

está a sombra a doer!

Caminha Companheiro

É chegada a hora de vencer. Marília Gonçalves

Quand le dernier arbre sera abattu,

La dernière rivière empoisonnée, Le dernier poisson pêché,

Alors vous découvrirez

Que l’argent ne se mange pas.”

Quando a última árvore for abatida,

A última ribeira envenenada, O último peixe pescado,

Então vocês descobrirão

Que o dinheiro não serve para comer.

Provérbio dos índios do Canadá

podem, por vezes, parecer menos evidentes a alguns de nós.




Algumas vezes esses poemas são uma homenagem a todos os que,




vencendo a sombra e a dor, fize ram de suas vidas um efectivo e elevado combate.




Latitudes — Agora, são os fóruns através da Internet. Que descober tas mais surpreendentes tem feito. M. G




.— A mais bela de todas: a de que afinal somos milhares a partil har a mesma visão,




os mesmos anseios e, graças à Internet e à proximidade que nos traz de outros




povos, esta imensa partilha, a mesma humana luta, rumo ao porvir




. O que até aqui nem sempre era possível por razões diversas,




algumas das quais materiais Hoje, num segundo, podemos dialo gar com irmãos em qualquer




ponto do mundo. No fundo, a Internet é como o vasto mundo, cada um escolhe




o caminho que lhe interessa. Os humanistas e os poetas vão a caminho do ser Humano.

Latitudes — Para quando a conti nuidade ao livro “À Procura do Traço”




que publicou faz mais de dez anos? Sei que não lhe falta poesia escrita.

M. G. — Depois disso saíram anto logias às quais estou ligada, %




Elos de Poesia, do grupo do mesmo nome, de que há um ano saiu o primeiro número estando o segundo no prelo.

E em El Verbo Descerrajado, de edição chilena, no seguimento




do combate de poetas em solidarie dade para com companheiros poetas




chilenos prisioneiros ainda do tempo de Pinochet e que esta vam em greve da fome.

Quanto a livro de minha poesia, apenas falta editora, que os p




oemas, esses, brotam de espontâ neo manancial.

Latitudes — A Marília nasceu num meio familiar muito sensível aos movimentos




sociais e cedo interveio neles. Que perspectiva nos traça nesse aspecto da nossa actualidade




e daquela que mais de perto a sensi biliza?

M. G. — A visão, chamemos-lhe assim, que hoje tenho das perspec




tivas sociais rumo ao futuro, não se afastam de modo algum da minha infantil




esperança num amanhã justo e fraterno.

Nós, seres humanos, atravessámos as mais conturbadas épocas, erguemo




nos da nossa condição primitiva, descemos das árvores e através de milénios aprendemos




fazendo colheita de cada experiência, de cada aventura, de cada sofrimento




. Hoje o ser humano alcançou um estado avançado de conhecimento,




como não confiar que essa apren dizagem não possa deixar de levar nos ainda




a maior conhecimento e compreensão. É verdade que esta mos presentemente




confrontados com a realidade ecológica que vai a curto prazo obrigar-nos




a uma escolha de sociedade. Seria um enorme desperdício




e um absurdo que a espécie humana em amplo conhecimento




se autodestruísse, sem que um impulso rumo ao futuro a leve




pelo racional caminho que a tanto esforço preparou.

Por outro lado os horizontes políti cos e religiosos atravessam as suas próprias




crises lançando muitos de nós na incredulidade e no cepti cismo.




Mas a verdade essa em que sempre acreditei é que desde sempre




os escravos se libertam, mesmo se, quais espartacos ou cristos,




nos vão crucificando no caminho.

Por isso o meu credo infinito no ser humano e na sua capacidade




de reflectir. Ante a escolha mais simples: a vida ou a morte, com




o respeito que a vida em sua origem nos merece.

E nesse respeito pela vida própria tudo se definirá política e social mente.




A Natureza e suas leis alia ram-se inevitavelmente aos que nunca tiveram




poder de decisão sobre as agressões que sofreu

E, porque a nossa inteligência vai saber afastar-nos de tão trágica conclu
, a esperança continua acesa e é sempre o caminho a escolher ●

1 Este semanário local era dos mais arrojados nos comentários e artigos que publicava, nessas décadas antes de Abril 74, tendo conquistado uma audiência nacional e muitos leitores em França.



Poemas a LISBOA

 

Meu coração de poeta

nasceu em Lisboa um dia

numa cidade secreta

que há dentro da nostalgia.

 

Foi feito de largos gestos

de pais, de tios e de primos

E d’emprestados avós

onde cresceu embalado

por pregões que ainda havia

nesse tempo ignorado

que a Liberdade mordia.

 

Meu coração de poeta

que me deu voz muito cedo

olhos e mãos e carícias

ia soletrando medo

no meu Pais de polícias

 

Mas coração de poeta

tem asas e lesto voa

pra de repente cair...

Minha cidade Lisboa

poeta do meu sentir.

 

Calçadas, pedras e ruas

Praça do Chile, Avenidas

Arroios e seu mercado...

Desdobravam-se-te vidas

no teu chão amordaçado.

 

Mas Lisboa era Lisboa

um coração a nascer

descobre que ainda voa

mesmo se lhe faz doer.

 

Voavam jornais dobrados

pelas varandas adentro

dos meus olhos que guardavam

a poeira que em bailado

estremecia na janela

entre a luz do cortinado.

 

Lisboa era muito mais

era o Jardim Constantino

onde bandos de pardais

ensinavam o menino

o ardina sem jornais.

 

Mas ia muito mais longe

Lisboa não acabava

prolongava-se no ar...

Nas corridas das varinas

chinelas a dar a dar.

 

Minha Lisboa de cegos

tocadores de concertina

de carros e de morangos

ou de ciganas que às vezes

passavam a ler a sina...

 

Minha Lisboa poeta

nos meus olhos de menina!

 

M.G. 

 

Lisboa. Heróis de Quionga...

Havia frio do Natal.

Pela mão de minha mãe

Imaginava Natais

Natais de quem não os tem.

 

Lisboa não tinha ali

no vento fresco da rua

a luz a decoração

do Rossio da Baixa toda;

Mas na imaginação

cada montra já perdida

dava o enlevo que então

só nos dá a própria vida.

 

Havia quase um calor

no frio, que sabia bem.

Porque falava de amor

mesmo àqueles que o não têm.

 

As prendas pobres pequenas

tinham a força do riso

a forma do coração...

Nada mais era preciso

Havendo risos e pão.

 

 

M.G. 

 

Que saudades avózinha

dos contos que me contavas

quando eu ainda menina

nada sabia do tempo

e soltava minhas asas

entre sonho pensamento.

Na tua voz me embalavas

os contos brandos macios

na voz em que mos contavas

era entre grave, serena.

A tua mão branca fina

poisava sobre a morena

cabeleira da menina.

 

Sentada numa cadeira

feita por teu irmão Zé

que conhecia a maneira

de transformar de moldar

com arte sabedoria

dos que domam a canseira

a fazer de noite o dia

sentada nessa cadeira

teu conto era mais verdade

havia na brincadeira

algo de seriedade.

 

No agrado de meus olhos

ao sorrirem para ti

não inventavas passado

o futuro era ali.

 

Presa nas tuas palavras

no azul que havia em ti

brincavam as tranças loiras

que ainda tens na memória...

teu conto era a vida inteira

tua vida, minha história.

 

Os anos foram passando

mas vejo o mesmo sorriso

a pairar sobre meu leito...

Meu pequeno paraíso

no teu quarto branco estreito

onde havia o mais preciso.

 

Ainda hoje estás sentada

na mesma eterna cadeira

embalo da meninice

a minha vida primeira:

A ternura do sorriso

que voltavas para mim

transportou-me a sábio mundo

onde o sonho principia

e começa o imaginário.

 

A volta do tempo ido

é que me trouxe ao que sou

entre o riso ou o gemido

o meu olhar não mudou.

 

Vejo tua mão na minha

acariciares-me a testa.

 

Ó minha querida velhinha

ser menina era uma festa.

Agora mulher e mãe

a tua lembrança doce

o teu vulto ao pé de mim

constróem meu dia de hoje...

A fazer-me ser assim!

 

M.G. 

 

Acima do país e da infância

de tudo quanto fui e que passou

ultrapassar do eco que é distancia

cidade a navegar no mar que sou

desenham-se fragatas no olhar

de quem partindo nunca regressou;

Lisboa a saber a mar

na sede que me ficou.

 

Atravesso tuas margens

meu rio minha juventude

cacilheiros e viagens

desses tempos em que pude

gravar na alma as imagens

No desferir de alaúde

fui levada na aragem

de vigor e de saúde.

 

Meu rio e minha cidade

o Tejo a espelhar canoa

espreita do alto o castelo…


Eu morro, ao dizer Lisboa.


Marilia Gonçalves



       POEMA TEJO

 

Estendida ao vento

a cidade tem nos olhos

a brancura em que se agita.

Aceite no espaço azul

tem voz de rio marinheiro.

 

Ancorada ao oceano

Lisboa tem voz de ABRIL

a olhar para o Barreiro.


 Marília Gonçalves