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O BLOGUE UNIVERSAL E INTERNACIONALISTA


A praça é do povo. Como o céu é do condor. É o antro onde a liberdade. Cria águias em seu calor! ...

A palavra! Vós roubais-la
Aos lábios da multidão
Dizeis, senhores, à lava
Que não rompa do vulcão.

Castro Alves
Jornal de Poesia

Deus! Ó Deus! Onde estás que não respondes? / Em que mundo, em que estrelas tu te escondes / Embuçado nos céus? /Há dois mil anos te mandei meu grito / Que, embalde, desde então corre o infinito... / Onde estás, Senhor Deus?

Castro Alves


MINHA LEI E MINHA REGRA HUMANA: AS PRIORIDADES.

Marília Gonçalves

Grandes almas sempre encontraram forte oposição de mentes medíocres.
Albert Einstein

Perguntas Com Resposta à Espera

Portugal ChamaS e Não Ouvem a Urgência de Teu Grito? Portugal em que http://www.blogger.com/img/gl.bold.gifinevitavelmente se incluem os que votando certo, viram resvalar de suas mãos a luz em que acreditavam; A LUTA CONTINUA )
Quem Acode à Tragédia de Portugal Vendido ao Poder dos Financeiros?! Quem Senão TU, POVO DE PORTUGAL?! Do Mundo inteiro a irmã de Portugal a filha. Marília Gonçalves a todos os falsos saudosistas lamurientos, que dizem (porque nem sabem do que falam) apreciar salazar como grande vulto,quero apenas a esses,dizer-lhes que não prestam! porque erguem seus sonhos sobre alicerces de sofrimento, do Povo a que pertencem e que tanto sofreu às mãos desse ditador!sobre o sofrimento duma geração de jovens ( a que vocês graças ao 25 de Abril escaparam)enviada para a guerra, tropeçar no horror e esbarrar na morte, sua e de outros a cada passo! sobre o sofrimento enfim de Portugal, que é vossa história, espoliado de bens e de gentes, tendo de fugir para terras de outros para poder sobreviver, enquanto Portugal ao abandono,via secar-se-lhe o pobre chão, sem braços que o dignificassem! Tudo isso foi salazar, servido por seus esbirros e por uma corte de bufos e de vendidos, que não olhavam a meios,para atingir seus malévolos fins!Construam se dentro de vós há sangue de gente, vossos sonhos, com base na realidade e não apoiando-os sobre mitos apodrecidos, no sangue de inocentes!!! Marília Gonçalves (pois é! feras não têm maiúscula!!!)

segunda-feira, 11 de agosto de 2025

CONTO PANTERA onça BRASIL ONÇA PEGOU VELHO PESCADOR E FILHO VINGOU--SE

 https://www.youtube.com/watch?v=IxE5Yg_6Dwk

 

O FILHO QUE VINGOU O PAI 

Me sonho antiga balada

 



Meu sonho antiga balada 

perdida composição

ficou-me no pó da estrada

esquecida em meu coração.

Nem a luz da alvorada

veio depô-la em minha mão.


Tinha timbre de oceano

na cor azul do trigal

em vagas de desengano

espraiando no areal

minha vida ano após ano

areia, pó, afinal.


Em som grave a procurei

uma cítara a tangia

porque caminhos andei

que nem ao longe a ouvia

Na voz que tinha chorei

mas nada ma devolvia.


Oh minha balada antiga

meu terno sonho de infante.

Não há palavra que diga

a voz pura que te cante.

Oh velha balada antiga

lembrando o dia distante.


Nunca tornarás a ser!

Como eu de mim me perdi...

mais ninguém sabe tanger

o que só eu aprendi.

Tanto a vida faz doer 

que nem tão pouco a vivi.


M.G.


              RONDEL DE AGOSTO



Às nuvens subia aroma de mosto

os bagos pisados no lagar escorriam

devolvendo ao céu quente sol de Agosto

no vapor do álcool vinhedos gemiam.


De aves forasteiras os cantos se ouviam

as mulheres cantavam e da cor do rosto

devolvendo ao céu quente sol de Agosto

no vapor do álcool vinhedos gemiam.


No regresso a casa após o sol posto

os corpos cansados, as pernas tremiam

levavam nos lábios memória do gosto

das uvas esmagadas que o lagar enchiam.

Às nuvens subia aroma de mosto.



M.G.


 Oh noites azuis do oriente

oh noites entre todas as mais belas 

oh noites onde o céu é transparente.


No brilho distante das estrelas

o véu de luz ilumina o deserto

oh noites de mito e aguarelas.


Meu olhar de vos anda tão perto

que se inunda de luz e de magia

oh noites a espelhar o céu aberto.


Ao longe me trespassa a nostalgia

por ter deixado em vos o meu olhar.

Na noite ocidental fico a espreitar

o brilho que de noite lembra o dia.



M.G.


                   Aos Casais das Comeiras-Aveiras de Cima

                         aos seus magníficos filhos e filhas 

                          uma das minhas humanas escolas da vida 

                          da solidariedade e da amizade sã e fraterna

                                                    Lininha




Guardo num cofre d’oiro pequenino

caminhos de sol a gargalhar

quando havia o timbre cristalino

na dança de vinhedos ao luar.


Níveo corcel espalhava ao vento a crina

ainda hoje presa ao meu olhar

azul o céu esvaia-se no ar

sobre o poeta com alma de menina.


Alvejava o moinho, asas de brim

perdido na tormenta da distância

minha longínqua torre de marfim.


Na acre caminhada para o fim

tempo loiro, distante, da infância

eterniza a imagem que há em mim.



M.G.



Anda à solta a ventania

veio dos confins do mundo...

passa por nós assobia

na voz que nos angustia

o coração num segundo.


Quem abriu a porta ao vento

pra gritar em iras tais?

Atravessou o momento

dos sonhos imateriais.


Quando é apenas aragem

sabe-nos bem e perfuma

o indicio de viagem

com ilusão de caruma.


Mas se for brisa afinal

tem cheiro acre marinho

paisagem de vendaval

em constante torvelinho.



M.G.



OH meu amor que fugiste

para não mais regressar

sem pensar na dor que existe

na ternura a soluçar.


Oiço uma fonte a gemer...

ou será a minha voz?

Não mais sei reconhecer

o sonho que havia em nós.


O ribeiro refulgente

saltita como saltei 

quando menina contente

não sabia o que hoje sei.


Se agora a vida me dói

lembro ainda com saudade

versos, canções que cantei

menina de pouca idade.



M.G.




                                                À  Claudia, a brincar

 


Deste-me o cheiro da rosa

ofereci-te um caramelo

vermelha era a flor vistosa

o bombom era amarelo.


Deste-me o cheiro da flor

depois o cheiro fugiu

provaste o doce sabor

que se desfez fio a fio.


Levaste contigo a rosa

flor roubada num jardim...

mas sendo também gulosa

rebuçado viu seu fim.


Em suma... tu emprestaste

o perfume dum segundo

enquanto saboreaste

o doce até ao seu fundo.



M.G.



              RONDEL DO MEDO


À noite o luar sobre arvoredo

desenha fantasmas formas irreais

mas a campesina tremia de medo

sentindo prendê-la traços vegetais.


Nos ninhos dormiam leves os pardais.

Trouxe-os o poente, de longe tão cedo...

nem  a sua voz se escutava mais.

Um monstro nascia de enorme penedo.


Tudo era mistério na noite em segredo

estreitos os caminhos sobrenaturais

trazendo à memória a voz do bruxedo

que ouvira em pequena no lar de seus pais

nos serões antigos o único enredo.



M.G.


                  RONDEL DA MORTE


Fugiste vulto amigo

na noite solitária

invadiu meu abrigo,

da morte, a emissária.


Minha força contrária

quer resistir ao perigo.

No triste lar antigo

 resisto temerária.


Pelo velho postigo

a luz incendiária

rejeita o inimigo...

voz de funérea ária

aponta-me o jazigo.



M.G.


OH olivais

vindos de trás...

sois vos que herdais

de nossos pais

símbolo de Paz!


Oh olivais

do esforço antigo

de nossos pais

sois vos que herdais

seu braço amigo

Oh olivais...


olivais de Paz sois o sustento

do magro caldo camponês

vos que sois alma, força e alento...

a vossa voz segue a do vento

a olhar o mundo de lés-a lés.


Olivais da Paz sois o tempero

da triste mesa do camponês

trémula luz no desespero

do seu cansaço, do frio severo

que os vai forçando mês após mês.


Oh olivais campo de esperança

vindo de outrora como tributo.

Dom ao futuro, na confiança

por cada vida cada criança!

Esforçada mão sem ver o fruto!


Oh olivais enluarados

folhas de prata a refulgir

pequenos frutos espezinhados...

liquido sol enche sobrados

quando a fadiga manda dormir.



M.G.


Nada tornará a ser!

Fugiu o riso de outrora

quando vi amanhecer 

a minha aurora.

O tempo não volta atrás...

nossos mais belos momentos

na alegria que é paz

efusão e sentimentos...

tudo se esfuma no tempo

cor ardente esmaecida...

à volta de nós o vento

gira...leva-nos a vida.


Será apenas o vento

comparsa amargo do tempo

ou o nosso sentimento

ainda na inocência...

ao ser traído não quer

escutar o som que ainda trás

raízes de esquecimento?


Nada tornará a ser!

A morte que é ainda vida

leva-nos tudo o que houver

da nossa infância perdida.


Os luminosos sorrisos

olhos humanos bondosos

que nos eram tão precisos

a guiarem-nos ditosos

entre mil cores paraísos...

nesse perfume de espanto

horas e dias de encanto

de gargalhadas, de risos.


Hoje o silêncio é o pranto 

os mortos, não mais estão vivos!  



M.G.


Na noite amarga

nossa voz larga

antigo canto.

Distante, longe

a agua foge

fonte de pranto.


Voz de guitarra

 ou de cigarra

noite de Verão

a voz desgarra 

luz ao serão.


Vêm poetas

fulgem cometas

caem estrelas

vozes secretas 

são indirectas 

cor de aguarelas.


Passam os dias 

em nostalgia 

cores outonais

paisagem fria

 da penedia

calam pardais.


Há sons marinhos

pelos caminhos

do voo breve...

onde os espinhos

rasgam os ninhos...

ai, fria neve.


M.G.



Saber se a sede do verso

esta fome do poema

o sonho vago disperso

que nos dói, nos envenena

são vozes do universo 

captadas pelo fonema.


Saber donde vem a fala

em que o poema interpreta

o mistério que se exala

da sua origem secreta.


Dão-lhe nome: inspiração.

Dom ou dádiva mas donde

que fonte nos traz à mão

o segredo em que se esconde?


Pétalas d’água alinhadas

na incerteza de ser. 

Formas que foram criadas 

pra tentar compreender.



M.G.



             OUTRA


Ser jovem, viver no campo

mas no campo verdadeiro.

Ter um poço um muro branco

um pomar de forte cheiro.

Ter uma pequena horta

um burro de olhos de brilho

ter em casa aberta a porta

fazer pão, ver rir um filho

ter rosas e sardinheiras

vermelhas como o sorriso.

Na sombra das oliveiras

paz de térreo paraíso;

ver à distância o pinhal

ter pinhas, juntar caruma

ver no vento o caniçal

a baloiçar cada pluma.

Escutar ao amanhecer

e no decorrer do dia 

asas a enaltecer

as vozes da alegria.

Ter uma ovelhinha loura

mais uma cabra castanha

ser alegre como outrora

ágil, romântica, estranha...

ir às cores do sol poente

ou ao azul da manhã 

buscar o verso veemente 

cantar a vida aldeã.

Tornar a sentir-me gente.

Fraterna, amiga, pagã.

Ver na alvura da mesa

 pão para ser repartido

oferta da natureza

 em minha mão construído.

Ser a mesma gargalhada

expontânea, boa, sincera,

à frente ver ainda estrada

ser ainda primavera.

Dar o bom-dia a quem passa

no costume camponês

olhar o sol na vidraça

dia-a-dia mês a mês.

No dia tempestuoso

saber, na chuva inclemente

o segredo luminoso

do germinar da semente.

Ser feliz de amar a vida

ter o amor companheiro

que dá alegria à lida

à noite, o calor, o cheiro.

À lareira no serão

ouvir os contos antigos...

ao pé a família, o cão,

a voz doce dos amigos.

Ser vertigem sensual

mas com alma de menina.

Enfim, se eu tal e qual

na força de cada rima! 



M.G.


Voam besouros louros

ao sol de estio.

Das sardinheiras 

malvas vermelhas...

perfume forte

envolve o ar.

Na estrada cantam

 as raparigas

 vão a passar.

Rubros canteiros

cachos vermelhos

que o tempo fez.

Voam abelhas 

de asas de luz.

No bebedouro

do poço velho

a água aquece

o céu azul.

Voam os tordos

pinhais oferecem

em grito verde fruto,

semente...

o cheiro forte

resina à sorte

 do fogo  sempre.

Ágeis pardais

voam prá sombra

ali vizinha.

Há olivais, 

miniaturais

 sois da noitinha. 

A vinha encobre

figueiras tortas

ressequidas

mas de seus braços

pendem pedaços

 do mel das vidas.

Milho na eira,

o malho dorme

com o calor.

Cantam os dias 

as cotovias,

será de amor?

A terra agreste

gretada veste

seu burel duro.

Só à tardinha

ao fim do dia

sob o ar puro

virá a água

correr os regos 

de leira em leira.

Novo perfume

acende o lume 

do anoitecer.

O sol no cume

vai-se escondendo

está a descer.

O céu escurece

a lua tece

seu branco véu.

Riem estrelas 

loiras e belas

enchendo o céu.

Ao longe o mocho

é o relógio de adormecer.

Cantam encantam

os rouxinóis

no ar levantam

claves que espantam

abrindo sois.

Há melodia

de noite, dia,

o lavrador

no seu cansaço

 mal vê o espaço

medido em dor.

O dia o deita

dia o levanta!

Na noite à espreita

 da alvorada

 o galo canta.



                                                        M.G.



                                       AO  MUNDO   em Memória de Meu Pai



 A Força da Poesia



Poesia guerrilheira

voz firme contemplativa

alastrando a terra inteira

na sua força expressiva.

Poesia que diz não

para construir o sim

quando repartido o pão

puder haver Paz enfim.



                                                            M.G.



        ALERTA


Grita filha

há uma aranha

 na brancura da parede

que peçonhenta, tamanha

vai tecendo a sua rede.

Grita filha!

Essa fobia

é protecção natural

contra a aranha sombria

que tem o símbolo do mal.

Grita com todas as forças!

Grita porque há  mesmo perigo

essa aranha, uma cruz negra

 é o pior inimigo.

Por meu amor não te cales!

Grita filha é tua mãe 

que te impele pra que fales...

contigo grita também!

Essa aranha que se estende

 tem o passo marcial

com fúria que surpreende

o incauto em voz fatal.

Grita filha

o bicho imundo

sai vertiginosamente

da sombra vinda do fundo

em veneno de serpente;

tal a jibóia medonha

enrola-se, abraça o mundo

para ir crescendo em peçonha.

Introduz-se em toda a parte

tudo corrói e desfaz

é inimiga da Arte, 

do Ser Humano, da Paz.

Grita filha mas tão alto

num grito tão verdadeiro

que desperte em sobressalto

o que não quer ver primeiro.

Essa aranha pestilenta

odeia a própria cultura

em fogueira que alimenta

livro após livro censura.

Opõe à humanidade

a sua força brutal;

por onde ela passa invade

mata o constitucional!

É um monstro repelente:

primeiro ataca o mais fraco

para ir seguidamente

oculta em cada buraco

destruir a liberdade!

Inimiga da diferença!

Grita minha filha grita

 faz ouvir tua presença.

Aponta o bicho feroz

mostra-o, sacode os amigos

com a força da tua voz!

Grita esse enredo de perigos!

Grita filha! Desta vez

é um grito racional

porque essa aranha é o não

ao direito universal.

Sem medo abre tua boca!

Grita alto! Grita forte!

Porque toda a força é pouca

para lutar contra a morte.

Grita, grita minha filha

não te cales nunca mais

não se veja outra bastilha

prender os próprios jornais!

Que teu grito seja infindo

circule dê volta ao mundo!

Jovem voz entusiástica

unindo o povo profundo

contra a bandeira suástica.



                                                        M.G.



                                    A Praça, a Praça é do povo

                                        como o céu é do condor.

                                            CASTRO ALVES



Vem desce à rua

poeta meu irmão!

No mundo a plebe

 continua

nua, vem

traz lhe o teu poema

coração.


Lembra Castro Alves

verdadeiro!

Voz dorida, sincera.

Ele foi o primeiro!

Nós continuação

do que ele era!


São precisos versos d’emoção!

Versos pra despertar

a letargia de cada coração

vem prá rua cantar!

Recorda o menino que dizia

que a praça era do povo!

Tal como nesse dia

acordemos à voz da poesia

a esperança, o mundo novo!


A nossa voz, irmãos de poesia

será circulação universal!

Românticos poetas, cada dia

terá de ser semente triunfal!

Há senhores, escravatura

hoje diferente, agrilhoando a voz

o pensamento!


Castro Alves virá à nossa frente

mostrar-nos a luta do presente!


Vem desce à rua

de braço dado não temos medo

o sol ilumina-nos o dia

nos confins do degredo!


Escuta a voz

do poeta que em mim fala

espelho da tua voz!

Não é poeta aquele que se cala

poetas somos nós 

que iremos avançando...

abrindo a noite

incendiá-la em luz!

Vencendo a lama atroz

que o mundo exala.

Para abrir céus azuis.


Vem! Vamos despertar a humanidade

em cada ser humano!

Atravessemos os campos a cidade

dia a dia, ano a ano!

Então nosso cantar terá sentido

Castro Alves condor

trás em versos o povo reerguido

saiamos do torpor.


Poetas: 

nossos versos, o poema

tem seiva de vida secular

vamos quebrar aos povos a algema

que agrilhoa o pensar.

É chegado o tempo de outra luta

elevemos a esperança

à certeza final que nos escuta 

como atenta criança. 

Unidos braço a braço, forte voz

faremos ecoar no infinito:

findou o reino do algoz

só ele é o proscrito!

Vamos abrir os cofres onde pão

sem serventia não tem outro valor.

Que repartido dê a cada irmão

a dignidade, semente do amor!


Voltemos a dar à poesia

a força da voz dos oprimidos!

Poetas saiamos para o dia

não queremos sofrimento nem gemidos!

Esse mundo fraterno que Jesus

ao mundo prometeu

será de Paz compreensão e luz

entre crente e ateu.


A poesia tem o dedo apontado

contra o usurpador.

Não queremos nunca mais o pão fechado

não queremos ver mais dor.


Poetas!

Castro  Alves está presente!

Vamos seguir-lhe o passo!

Nunca mais nos morra friamente

um irmão de fome, de cansaço.


É urgente mostrar à juventude

a beleza do mundo!

Acabando de vez com a turpitude

nós trazemos do fundo

humanos fraternos sentimentos

para cada criança

o mundo pacifico criemos

fraterna luz de esperança!


Então voltará a alegria

e o terceiro milénio

será enfim

o mundo da harmonia

em nova transfusão de oxigénio!

Respiremos de paz!

Consciência justa

nada tem a temer

venha do mundo inteiro

a voz que faz 

a nossa voz romper!


Do grito solidário futurista

o mundo vai nascer.





                                                                 M.G. 

 

Por um antifascista morto

quatro se levantarão!

Navio que ao chegar ao porto

deixa entrar luz no porão.

Assim surgirão mil vozes 

no verbo multiplicar

denuncia contra os algozes

 contra a sede de matar.

Na voz do antifascista

há gritos de Liberdade

pra que cada um resista 

e seja fraternidade.

Que no amor mais profundo

os povos sejam irmãos

para que haja Paz no mundo

com todos de mãos nas mãos.

Que nos importa que o sol

que nos dá tanta alegria

seja diferente arrebol

em cada pele que nascia.

Cada terra, continente

tem sua própria cultura.

Cada um de nós diferente

mas no espirito abertura!

Sermos quem somos, tal qual...

mas ver no que os outros são

um direito universal

em usos, religião.

Mas sempre o mesmo respeito 

deve unir um povo a outro,

desdenhando o preconceito

inventar o mundo novo!

Não ter medo de falar

de trocar opiniões

cada um de nós a escutar

as mais diversas razoes.

Mas a querer compreender 

sem nunca impor partilhar,

pra podermos ver nascer 

dia de amor a brilhar.


Por isso não há quem vença

o que morrer convencido

por cada morto apareça

um povo de olhar erguido!


Não passará o fascismo

onde couber a razão

abramos ao altruísmo

as portas do coração.

A batalha será ganha;

a Paz será a vitoria!

Esse verme, ou essa aranha

não mais entrarão na historia. 



M.G.




Meu menino na distância

uma pomba de ternura

virá sobre tua infância

numa voz suave, pura.


Meu doce terno menino

numa canção de embalar

venho dizer-te baixinho

que o sol vai nascer, brilhar.


Água fresca, transparente

virá trazer-te a beber

paz que o coração te pede

oh meu menino a crescer.



M.G.


Meu amor de olhos marinhos

onde eu queria naufragar

mas desconheço caminhos

que me levem ao teu mar.


Branco luar se desata

do teu olhar negro, escuro

como cascata de prata

a iluminar o futuro.


Navego nas tuas mãos

ardentia de desejo

entre cânticos pagãos

e a musica dum beijo.


Mas o teu olhar ternura

inunda-me novamente.

És na noite azul, escura

o contaste refulgente.


Meu amor, luz do meu dia

que outro igual amanhece

na tua pele luzidia

é que meu corpo acontece. 



M.G.



O velho trémulo

de frio caiu

entre o rebanho

está tão mudado

há tanto tempo

subindo o prado.


No lar família

aconchegada.

A voz da Emilia 

também cansada

espera o pastor.

Longa jornada

desde o nascente

ao sol a por.


A noite avança.

Uma criança 

chora no berço.

Ao canto, só

a velha avo

reza seu terço.


Um vago medo...

pressentimento?

Quem o dirá;

a noite cedo 

fecha o segredo 

escurece já.


O pastor não vem

ouve-se alguém

pedir ajuda.

A avo triste

no escuro assiste 

que povo acuda.


Hei-los em bando

trevas trepando

na serrania

na voz do berço 

sobe a do terço 

em agonia.


O pastor caído

sem um gemido

regela agora

só o latido 

do cão amigo

vai noite fora.


Como sinal

se ouve afinal

o cão ao longe.

No matagal

o povo acorre 

como quem foge.


Erguem do solo

levam ao colo

para seu lar.

Ouve-se Eolo

por toda a serra

 em frio uivar.


Chegado a casa

 à lareira em brasa 

é posto ao pé.

Chora a família

geme a Emilia

que morto o vê.


Insana lida

apenas vida 

magro sustento!

Na despedida 

na voz do cão

uiva a do vento.


Fim do cansaço

gélido abraço

o pastor estreitou.

Descai-lhe o braço

parou o passo

já descansou...


A pobre herança

de quem se cansa 

a trabalhar

é a criança

na mesma dança 

que irá girar.


Tanto trabalho

desaconchego

tanto labor...

eterna bulha

 pra encher a tulha

ao lavrador.



M.G.







Formulam-se interesses

e leis que os defendem

noções correspondem 

à tónica incerta.


Balanço quebrado

flutua também

no lago gelado

 da base de alguém.


Compõem os ritmos

exemplos, memórias

por fora das silabas 

de nossas historias.


Mas se musicais

nos falam os dias

não voltarão mais

 as vãs cotovias.



M.G.



Meu amor, sonhei contigo

mas parei entristecida

vejo em teus olhos o perigo

que condena minha vida.


Tal perigo suave fora

se abrandasses teu andar...

passaste foste-te embora

aqui fiquei a sonhar.


Levaste na caminhada

todo o tempo que era meu...

nas aos não me ficou nada

tudo de mim se perdeu.


Ficaram sete palavras

desenho a fogo d’inferno...

no meu sofrer vens e lavras

poemas no meu caderno.


Meu amor

sonhei contigo...

minha dor 

d’entontecer

sei que perdi

 meu amigo

ou não o cheguei a ter.


Meu amor

na solidão

surgiram rubros punhais

abrindo meu coração

às panteras aos chacais.


Fugiu-me o sonho de amor.

Parei à margem da vida.

Desfolhada como flor

pelo vendaval perseguida.



M.G.



A noite bate à porta.

Amargo exílio

quando o dia findou

a luz não mais transporta

o tempo que voou.


A sombra lenta vence

o dia que escurece.


Na mão do poeta adormecido

está à espera um verso

ou um gemido.

Seu olhar 

de contemplações repleto

parece serenar em sono quieto.


Mas no sono aparente

dessa visão tranquila

agitam-se fantasmas 

em saltos de arlequim.

Há vestígios marinhos

alinhando-se em fila

caminho entre escarpas 

sem chegar ao fim.


Mas o poeta dorme.

Enquanto dorme escreve

poemas corpóreos

de vozes minerais.

vê deslizar por ele

entre restos de trapo

as famélicas  fauces 

entre ervas animais.


Há um dedo estendido

como livro futuro

que nunca conseguiu.

Pálido poeta

a tropeçar no escuro

a desenhar nos ares

sons que não ouviu.

Sabe ser responsável

como se rio de tinta

navegasse veloz

entre quentes palavras.

O poeta no sonho sente 

faltar-lhe a voz

entreabre os olhos 

à procura da fala.


A um canto do quarto

há um baú d’estanho

que viera do tempo

através dos avos

baú entreaberto

para universo estranho

começo do silêncio

a espelhar-se na voz.


Há um gesto d’infância

no olhar que procura

o fazedor de versos

vai atras da verdade

a tropeçar nas rochas

a tropeçar na sombra

que formam o inicio 

de toda a eternidade.



M.G. 



Falar de ti 

dizer quem és

que percebi 

tuas marés

aonde vais

donde vieste

prantos e ais

quantos tiveste.

Quem adivinha

se há no trovão

a carga eléctrica

capaz de ser

ternura ou pão.



M.G.



 Água  pura, breve passa

pra não voltar nunca mais.

Meu grito se despedaça

navio onde está teu cais.



M.G.



Inventei outro ser. Olhos humanos

inexistentes, apenas pressentidos

andei-os soletrando em desengano

no subúrbio dos sonhos aluídos.


Talvez o fantasma transparente

deixasse atravessar em palidez

a luz vinda de longe opalescente

que no ar morno em sombra se desfez.


Ano após ano, fui construindo o dia

verídico, intenso, universal

mas o olhar que nos meus olhos via

ia  perdendo o brilho natural.


Na escuridão mais nada deslumbrava

essa visão, imagem destruída...

mas quanto mais a luz me iluminava

menos via brilhar a minha vida. 



M.G.


  

Mágica noite de encanto

donde vem a tua voz

feita de sonho, de pranto

a sombra  que é o teu manto

soluça dento de nós.


Estrelas perfumam com oiro

a nocturna solidão

o dia esconde-se loiro.

Escondeu o sol, nasce a lua

arco de castelo moiro

emoldura a noite nua.


Dançam névoas pelo céu.

O azul oriental

é o teu olhar no meu

tão escuro que me faz mal.

O mar desenha uma vela

de nau há muito distante...

de nau ou de caravela

que segue rumo a Levante.


Ondas que vêm de manso

acariciar a pele

do sonho que sem descanso

vai mis longe do que alcanço

na brancura do papel.


Meu sonho! Todo em lonjura!

Purpúrea acende-se a tarde...

se é febre, raiva ou loucura

têm a voz da ternura

que em meus olhos em ti arde.



M.G.




Numa caixa colorida

de suave tom perfumada

descobri a minha vida

em fita de seda atada.


Desfiz o no que ela tinha

dei-lhe asas, fi-la voar

vi-a partir andorinha

negro voo sobre o mar.


Desde então a minha vida

a mim nunca mais voltou.

Na areia, entristecida

espero-a ainda não poisou. 



M.G.



Fazedora de versos esquecidos

quem se lembra de mim?

Tantos versos que sentidos

foram início e o fim.


Na noite assustadora

nenhum verso me aquece

ou ilumina

o tempo dia a dia vai embora

perdeu-se da menina.


Transparente, invisível

quem me vê

Ou sabe aonde vou?

Eterno porquê 

que a vida fecundou.



M.G.



Desperto sou água mansa

desaguo no olhar

do que há em mim

da criança

que vê afundar a esperança

de novo dia raiar.


Dissipou-se entre tentáculos

em translúcida ameaça

falam distantes oráculos

prenuncio duma desgraça.


Mas vem a água fluindo

de Delfos até aqui

traz-me de Apolo esculpido

cada verso que escrevi.


Paro. Colheita de sons

de imagens de poesia.

Na hora dos semitons

há nostalgia.



M.G.

 


Falei do mar dos teus olhos

da aprendizagem do sol

vi arremessar a escolhos

o voo dum rouxinol.


Disse palavras de Verão

na surpresa do Inverno

esvaídos em tua mão

os versos do meu caderno.


A longa estrada que um dia

te viu subir para mim

era uma álea perdida

árvores de outro jardim.


Mas na distância do tempo

que nos afasta de nós

perdeu o sol o alento

que nos acendia a voz.



M.G.



Nas mãos de meu amigo

deito o rosto

de muitas madrugadas

e do medo.

Descanso os uivos internos

de luas por diluir.

Ao encontrar-me comigo

entre mãos do meu amigo

sou mais eu!

Alegre ou triste

sinto que tudo o que existe

girando em volta de nós 

espelha o mundo que persiste

na minha, na sua voz.

É nas mãos de meu amigo

que descubro a dimensão

do verso escrito em que digo

haver nos olhos do pão

esta fome que não finda

fraterna, de liberdade

numa fecunda seara

pra toda a humanidade.



M.G.



Quando havia sorrisos transparentes

como o fluir de águas de cristal

quando meus olhos eram inocentes

ingénuos do que é bem ou do que é mal

minha voz tinha o timbre de luz

saltitar de ideias movimento

agora oiço na minha voz a voz do vento

angustia de caminhos percorridos

a dor, a mesma dor

a procurar sempre uma resposta

porquê inocente doutra infância

na imposta solidão.

Tempo nascente ao sorriso do sol.

Hoje são doridos os meus passos

olhos que se negam não são meus

se a delirar por ti abro eus braços

neles sei que não terei os teus.



M.G.



Duas tranças minha avo

teve no tempo menino

seus irmãos eram crianças

as suas vozes um hino.


Os búzios vinham de longe

olhos de pai marinheiro

historias no tempo que foge

entre as águas e um veleiro.


Quase um século, um milénio

quem sabe o tempo medir?

Mais vidas oxigénio

em cada dia a fugir.


Rumo ao sul. Ou polo norte

a tarde avança fremente

levada por vento forte

transforma os outros na gente.


Mas a vida borboleta

nas tranças de minha avo

vai seguindo a linha recta

do dia de ficar só.



M.G.

                                                             pergunto ao vento que passa

                                                             noticias do meu pais.  


Lisboa anda em Paris                                        MANUEL  ALEGRE

Tejo, Sena

nem sei bem como são

a cidade repleta

do cantar do poeta

 que vai por outra mão.


São férias? Talvez não.

Este perfume estranho

é mais uma canção

ou é mais um desenho.


Colorido, cinzento?

O que sei afinal

é que nem sempre o vento

é fúria ou vendaval! 



M.G.


Eu na areia loura

olhava-te em altura.

Tu olhavas o céu

tão enorme lonjura

do teu olhar ao meu.


Eu na areia fina

o teu olhar buscava

eu, era uma menina

tu, um deus que passava.


Nos teus olhos pardos 

à cor do mar já feitos

faiscavam os dardos 

que os meus tinham  desfeitos.



M.G.


Um cisne verde

desliza sobre a erva.

Tudo é branco e azul

numa planície estranha

em dedos de água gelados.

Perto laranjais de longo gesto.



Pássaros d’água desenham a brancura

do linho rente à margem.

Pinhais azuis voadores

são início  de viagem

quando cisnes de surpresa

vêem  abrir nova cor.

Tornam-se então todos roxos

com musica de flor seca

ou de palmeira inventada.

O lago d’água invisível

perfuma a noite de treva

em cheiro matricial.

Adão Eva, nem tão pouco original.

Há um barco que procura

o cais da bruma azulada.

Quando a bruma perde a cor

o barco não é mais nada.

Desaparecem os cisnes 

cai um poema na estrada.



M.G.



Estendia-se o espaço

movimento abria novos horizontes

o tempo inexorável laço

unia os homens as fontes.

Água branda ao de leve afastava

nascente pressentida 

na força que a levava.

Essência em forma de vida

tinha estranho colorido

de passos, de mais passos

até serem vórtice ou sentido

de intermináveis traços.


Assim a água foi seguindo

sob luz vertical que a ilumina

água de minha sede Portugal

na fome de poeta e de menina.



M.G.



Aqui é o sitio do amor

se vieres bater à porta

com olhos e coração

a bagagem pouco importa

encontrarás cama e pão.


Pão cem vezes repartido

um pedaço será teu.

Pão em forno colorido

na cor que o amor lhe deu.


Bate à porta e entrarás.

Protegido contra feras.

Casa a caminho da Paz 

onde não entram panteras.


Aceita a mão que se estende!

Não está vazia! Ilusão,

mesmo se o parece entende

está cheia de coração.


Se o caminho que é da casa

atravessar o que é teu

verás a lareira em brasa

que de pronto se acendeu.


Humano irmão, não hesites

tudo o que aqui há é teu

pois nunca haverá limites 

para a luz de Prometeu.



M.G.



Não quero saber se isto que sinto

é mágoa raiva dor angustia ou morte

ao esmaecer das tinas em que pinto

o tempo sem medida eterno, forte.


Foram caindo as forças que eram minhas

até meu gargalhar escureceu.

Volto pra trás meus olhos prás tardinhas

na poalha de luz que ‘inda era eu.


Adormeceram-me os olhos coloridos

o céu azul perdeu-se rente ao mar

mas oiço ainda bater nos meus ouvidos

o mundo sem maldade por criar.


Embalada na sombra duma esperança

conheci o sentimento mais fraterno.

Há no meu peito ainda essa criança

nascida em mãos de luz no frio Inverno.


Meu canto agora é uma despedida

do mundo que existiu dentro de mim!

Ao cair morta como a ave ferida

levo meu sonho comigo até ao fim.



M.G.

Olho a paisagem invento

maré de olhar fugidia

na sombra do pensamento 

és e não és quem eu queria.


És e não és. Apareces

 ilusão dúbio sentido

nas palavras esmoreces

tempo, do tempo perdido.


Olhar de água, movimento

obscura transparência

adejar, sabor a vento

pousio de terna inocência.


Sobressalto na viagem

sem porto onde chegar.

Vou levada na voragem

de teus olhos cor do mar.



M.G.



Me sonho antiga balada 

perdida composição

ficou-me no pó da estrada

esquecida em meu coração.

Nem a luz da alvorada

veio depô-la em minha mão.


Tinha timbre de oceano

na cor azul do trigal

em vagas de desengano

espraiando no areal

minha vida ano após ano

areia, pó, afinal.


Em som grave a procurei

uma citara a tangia

porque caminhos andei

que nem ao longe a ouvia?

Na voz que tinha chorei

mas nada ma devolvia.


Oh minha balada antiga

meu terno sonho de infante.

Não há palavra que diga

a voz pura que te cante.

Oh velha balada antiga

lembrando o dia distante.


Nunca tornarás a ser!

Como eu de mim me perdi...

mais ninguém sabe tanger

o que só eu aprendi.

Tanto a vida faz doer 

que nem tão pouco a vivi.


M.G.


              RONDEL DE AGOSTO



Às nuvens subia aroma de mosto

os bagos pisados no lagar escorriam

devolvendo ao céu quente sol de Agosto

no vapor do álcool vinhedos gemiam.


De aves forasteiras os cantos se ouviam

as mulheres cantavam e da cor do rosto

devolvendo ao céu quente sol de Agosto

no vapor do álcool vinhedos gemiam.


No regresso a casa após o sol posto

os corpos cansados, as pernas tremiam

levavam nos lábios memória do gosto

das uvas esmagadas que o lagar enchiam.

Às nuvens subia aroma de mosto.



M.G.


 Oh noites azuis do oriente

oh noites entre todas as mais belas 

oh noites onde o céu é transparente.


No brilho distante das estrelas

o véu de luz ilumina o deserto

oh noites de mito e aguarelas.


Meu olhar de vos anda tão perto

que se inunda de luz e de magia

oh noites a espelhar o céu aberto.


Ao longe me trespassa a nostalgia

por ter deixado em vos o meu olhar.

Na noite ocidental fico a espreitar

o brilho que de noite lembra o dia.



M.G.


                   Aos Casais das Comeiras-Aveiras de Cima

                         aos seus magníficos filhos e filhas 

                          uma das minhas humanas escolas da vida 

                          da solidariedade e da amizade sã e fraterna

                                                    Lininha




Guardo num cofre d’oiro pequenino

caminhos de sol a gargalhar

quando havia o timbre cristalino

na dança de vinhedos ao luar.


Níveo corcel espalhava ao vento a crina

ainda hoje presa ao meu olhar

azul o céu esvaia-se no ar

sobre o poeta com alma de menina.


Alvejava o moinho, asas de brim

perdido na tormenta da distância

minha longínqua torre de marfim.


Na acre caminhada para o fim

tempo loiro, distante, da infância

eterniza a imagem que há em mim.



M.G.



Anda à solta a ventania

veio dos confins do mundo...

passa por nós assobia

na voz que nos angustia

o coração num segundo.


Quem abriu a porta ao vento

pra gritar em iras tais?

Atravessou o momento

dos sonhos imateriais.


Quando é apenas aragem

sabe-nos bem e perfuma

o indicio de viagem

com ilusão de caruma.


Mas se for brisa afinal

tem cheiro acre marinho

paisagem de vendaval

em constante torvelinho.



M.G.



OH meu amor que fugiste

para não mais regressar

sem pensar na dor que existe

na ternura a soluçar.


Oiço uma fonte a gemer...

ou será a minha voz?

Não mais sei reconhecer

o sonho que havia em nós.


O ribeiro refulgente

saltita como saltei 

quando menina contente

não sabia o que hoje sei.


Se agora a vida me dói

lembro ainda com saudade

versos, canções que cantei

menina de pouca idade.



M.G.




                                                À  Claudia, a brincar

 


Deste-me o cheiro da rosa

ofereci-te um caramelo

vermelha era a flor vistosa

o bombom era amarelo.


Deste-me o cheiro da flor

depois o cheiro fugiu

provaste o doce sabor

que se desfez fio a fio.


Levaste contigo a rosa

flor roubada num jardim...

mas sendo também gulosa

rebuçado viu seu fim.


Em suma... tu emprestaste

o perfume dum segundo

enquanto saboreaste

o doce até ao seu fundo.



M.G.



              RONDEL DO MEDO


À noite o luar sobre arvoredo

desenha fantasmas formas irreais

mas a campesina tremia de medo

sentindo prendê-la traços vegetais.


Nos ninhos dormiam leves os pardais.

Trouxe-os o poente, de longe tão cedo...

nem  a sua voz se escutava mais.

Um monstro nascia de enorme penedo.


Tudo era mistério na noite em segredo

estreitos os caminhos sobrenaturais

trazendo à memória a voz do bruxedo

que ouvira em pequena no lar de seus pais

nos serões antigos o único enredo.



M.G.


                  RONDEL DA MORTE


Fugiste vulto amigo

na noite solitária

invadiu meu abrigo,

da morte, a emissária.


Minha força contrária

quer resistir ao perigo.

No triste lar antigo

 resisto temerária.


Pelo velho postigo

a luz incendiária

rejeita o inimigo...

voz de funérea ária

aponta-me o jazigo.



M.G.


OH olivais

vindos de trás...

sois vos que herdais

de nossos pais

símbolo de Paz!


Oh olivais

do esforço antigo

de nossos pais

sois vos que herdais

seu braço amigo

Oh olivais...


olivais de Paz sois o sustento

do magro caldo camponês

vos que sois alma, força e alento...

a vossa voz segue a do vento

a olhar o mundo de lés-a lés.


Olivais da Paz sois o tempero

da triste mesa do camponês

trémula luz no desespero

do seu cansaço, do frio severo

que os vai forçando mês após mês.


Oh olivais campo de esperança

vindo de outrora como tributo.

Dom ao futuro, na confiança

por cada vida cada criança!

Esforçada mão sem ver o fruto!


Oh olivais enluarados

folhas de prata a refulgir

pequenos frutos espezinhados...

liquido sol enche sobrados

quando a fadiga manda dormir.



M.G.


Nada tornará a ser!

Fugiu o riso de outrora

quando vi amanhecer 

a minha aurora.

O tempo não volta atrás...

nossos mais belos momentos

na alegria que é paz

efusão e sentimentos...

tudo se esfuma no tempo

cor ardente esmaecida...

à volta de nós o vento

gira...leva-nos a vida.


Será apenas o vento

comparsa amargo do tempo

ou o nosso sentimento

ainda na inocência...

ao ser traído não quer

escutar o som que ainda trás

raízes de esquecimento?


Nada tornará a ser!

A morte que é ainda vida

leva-nos tudo o que houver

da nossa infância perdida.


Os luminosos sorrisos

olhos humanos bondosos

que nos eram tão precisos

a guiarem-nos ditosos

entre mil cores paraísos...

nesse perfume de espanto

horas e dias de encanto

de gargalhadas, de risos.


Hoje o silêncio é o pranto 

os mortos, não mais estão vivos!  



M.G.


Na noite amarga

nossa voz larga

antigo canto.

Distante, longe

a agua foge

fonte de pranto.


Voz de guitarra

 ou de cigarra

noite de Verão

a voz desgarra 

luz ao serão.


Vêm poetas

fulgem cometas

caem estrelas

vozes secretas 

são indirectas 

cor de aguarelas.


Passam os dias 

em nostalgia 

cores outonais

paisagem fria

 na penedia

calam pardais.


Há sons marinhos

pelos caminhos

do voo breve...

onde os espinhos

rasgam os ninhos...

ai, fria neve.


M.G.



Saber se a sede do verso

esta fome do poema

o sonho vago disperso

que nos dói, nos envenena

são vozes do universo 

captadas pelo fonema.


Saber donde vem a fala

em que o poema interpreta

o mistério que se exala

da sua origem secreta.


Dão-lhe nome: inspiração.

Dom ou dádiva mas donde

que fonte nos traz à mão

o segredo em que se esconde?


Pétalas d’água alinhadas

na incerteza de ser. 

Formas que foram criadas 

pra tentar compreender.



M.G.



             OUTRA


Ser jovem, viver no campo

mas no campo verdadeiro.

Ter um poço um muro branco

um pomar de forte cheiro.

Ter uma pequena horta

um burro de olhos de brilho

ter em casa aberta a porta

fazer pão, ver rir um filho

ter rosas e sardinheiras

vermelhas como o sorriso.

Na sombra das oliveiras

paz de térreo paraíso;

ver à distância o pinhal

ter pinhas, juntar caruma

ver no vento o caniçal

a baloiçar cada pluma.

Escutar ao amanhecer

e no decorrer do dia 

asas a enaltecer

as vozes da alegria.

Ter uma ovelhinha loura

mais uma cabra castanha

ser alegre como outrora

ágil, romântica, estranha...

ir às cores do sol poente

ou ao azul da manhã 

buscar o verso veemente 

cantar a vida aldeã.

Tornar a sentir-me gente.

Fraterna, amiga, pagã.

Ver na alvura da mesa

 pão para ser repartido

oferta da natureza

 em minha mão construído.

Ser a mesma gargalhada

expontânea, boa, sincera,

à frente ver ainda estrada

ser ainda primavera.

Dar o bom-dia a quem passa

no costume camponês

olhar o sol na vidraça

dia-a-dia mês a mês.

No dia tempestuoso

saber, na chuva inclemente

o segredo luminoso

do germinar da semente.

Ser feliz de amar a vida

ter o amor companheiro

que dá alegria à lida

à noite, o calor, o cheiro.

À lareira no serão

ouvir os contos antigos...

ao pé a família, o cão,

a voz doce dos amigos.

Ser vertigem sensual

mas com alma de menina.

Enfim, se eu tal e qual

na força de cada rima! 



M.G.


Voam besouros louros

ao sol de estio.

Das sardinheiras 

malvas vermelhas...

perfume forte

envolve o ar.

Na estrada cantam

 as raparigas

 vão a passar.

Rubros canteiros

cachos vermelhos

que o tempo fez.

Voam abelhas 

de asas de luz.

No bebedouro

do poço velho

a água aquece

o céu azul.

Voam os tordos

pinhais oferecem

em grito verde fruto,

semente...

o cheiro forte

resina à sorte

 do fogo  sempre.

Ágeis pardais

voam prá sombra

ali vizinha.

Há olivais, 

miniaturais

 sois da noitinha. 

A vinha encobre

figueiras tortas

ressequidas

mas de seus braços

pendem pedaços

 do mel das vidas.

Milho na eira,

o malho dorme

com o calor.

Cantam os dias 

as cotovias,

será de amor?

A terra agreste

gretada veste

seu burel duro.

Só à tardinha

ao fim do dia

sob o ar puro

virá a água

correr os regos 

de leira em leira.

Novo perfume

acende o lume 

do anoitecer.

O sol no cume

vai-se escondendo

está a descer.

O céu escurece

a lua tece

seu branco véu.

Riem estrelas 

loiras e belas

enchendo o céu.

Ao longe o mocho

é o relógio de adormecer.

Cantam encantam

os rouxinóis

no ar levantam

claves que espantam

abrindo sois.

Há melodia

de noite, dia,

o lavrador

no seu cansaço

 mal vê o espaço

medido em dor.

O dia o deita

dia o levanta!

Na noite à espreita

 da alvorada

 o galo canta.



                                                        M.G.



                                       AO  MUNDO   em Memória de Meu Pai



 A Força da Poesia



Poesia guerrilheira

voz firme contemplativa

alastrando a terra inteira

na sua força expressiva.

Poesia que diz não

para construir o sim

quando repartido o pão

puder haver Paz enfim.



                                                            M.G.



        ALERTA


Grita filha

há uma aranha

 na brancura da parede

que peçonhenta, tamanha

vai tecendo a sua rede.

Grita filha!

Essa fobia

é protecção natural

contra a aranha sombria

que tem o símbolo do mal.

Grita com todas as forças!

Grita porque há  mesmo perigo

essa aranha, uma cruz negra

 é o pior inimigo.

Por meu amor não te cales!

Grita filha é tua mãe 

que te impele pra que fales...

contigo grita também!

Essa aranha que se estende

 tem o passo marcial

com fúria que surpreende

o incauto em voz fatal.

Grita filha

o bicho imundo

sai vertiginosamente

da sombra vinda do fundo

em veneno de serpente;

tal a jibóia medonha

enrola-se, abraça o mundo

para ir crescendo em peçonha.

Introduz-se em toda a parte

tudo corrói e desfaz

é inimiga da Arte, 

do Ser Humano, da Paz.

Grita filha mas tão alto

num grito tão verdadeiro

que desperte em sobressalto

o que não quer ver primeiro.

Essa aranha pestilenta

odeia a própria cultura

em fogueira que alimenta

livro após livro censura.

Opõe à humanidade

a sua força brutal;

por onde ela passa invade

mata o constitucional!

É um monstro repelente:

primeiro ataca o mais fraco

para ir seguidamente

oculta em cada buraco

destruir a liberdade!

Inimiga da diferença!

Grita minha filha grita

 faz ouvir tua presença.

Aponta o bicho feroz

mostra-o, sacode os amigos

com a força da tua voz!

Grita esse enredo de perigos!

Grita filha! Desta vez

é um grito racional

porque essa aranha é o não

ao direito universal.

Sem medo abre tua boca!

Grita alto! Grita forte!

Porque toda a força é pouca

para lutar contra a morte.

Grita, grita minha filha

não te cales nunca mais

não se veja outra bastilha

prender os próprios jornais!

Que teu grito seja infindo

circule dê volta ao mundo!

Jovem voz entusiástica

unindo o povo profundo

contra a bandeira suástica.



                                                        M.G.



                                    A Praça, a Praça é do povo

                                        como o céu é do condor.

                                            CASTRO ALVES



Vem desce à rua

poeta meu irmão!

No mundo a plebe

 continua

nua, vem

traz lhe o teu poema

coração.


Lembra Castro Alves

verdadeiro!

Voz dorida, sincera.

Ele foi o primeiro!

Nós continuação

do que ele era!


São precisos versos d’emoção!

Versos pra despertar

a letargia de cada coração

vem prá rua cantar!

Recorda o menino que dizia

que a praça era do povo!

Tal como nesse dia

acordemos à voz da poesia

a esperança, o mundo novo!


A nossa voz, irmãos de poesia

será circulação universal!

Românticos poetas, cada dia

terá de ser semente triunfal!

Há senhores, escravatura

hoje diferente, agrilhoando a voz

o pensamento!


Castro Alves virá à nossa frente

mostrar-nos a luta do presente!


Vem desce à rua

de braço dado não temos medo

o sol ilumina-nos o dia

nos confins do degredo!


Escuta a voz

do poeta que em mim fala

espelho da tua voz!

Não é poeta aquele que se cala

poetas somos nós 

que iremos avançando...

abrindo a noite

incendiá-la em luz!

Vencendo a lama atroz

que o mundo exala.

Para abrir céus azuis.


Vem! Vamos despertar a humanidade

em cada ser humano!

Atravessemos os campos a cidade

dia a dia, ano a ano!

Então nosso cantar terá sentido

Castro Alves condor

trás em versos o povo reerguido

saiamos do torpor.


Poetas: 

nossos versos, o poema

tem seiva de vida secular

vamos quebrar aos povos a algema

que agrilhoa o pensar.

É chegado o tempo de outra luta

elevemos a esperança

à certeza final que nos escuta 

como atenta criança. 

Unidos braço a braço, forte voz

faremos ecoar no infinito:

findou o reino do algoz

só ele é o proscrito!

Vamos abrir os cofres onde pão

sem serventia não tem outro valor.

Que repartido dê a cada irmão

a dignidade, semente do amor!


Voltemos a dar à poesia

a força da voz dos oprimidos!

Poetas saiamos para o dia

não queremos sofrimento nem gemidos!

Esse mundo fraterno que Jesus

ao mundo prometeu

será de Paz compreensão e luz

entre crente e ateu.


A poesia tem o dedo apontado

contra o usurpador.

Não queremos nunca mais o pão fechado

não queremos ver mais dor.


Poetas!

Castro  Alves está presente!

Vamos seguir-lhe o passo!

Nunca mais nos morra friamente

um irmão de fome, de cansaço.


É urgente mostrar à juventude

a beleza do mundo!

Acabando de vez com a turpitude

nós trazemos do fundo

humanos fraternos sentimentos

para cada criança

o mundo pacifico criemos

fraterna luz de esperança!


Então voltará a alegria

e o terceiro milénio

será enfim

o mundo da harmonia

em nova transfusão de oxigénio!

Respiremos de paz!

Consciência justa

nada tem a temer

venha do mundo inteiro

a voz que faz 

a nossa voz romper!


Do grito solidário futurista

o mundo vai nascer.





                                                                 M.G. 

 

Por um antifascista morto

quatro se levantarão!

Navio que ao chegar ao porto

deixa entrar luz no porão.

Assim surgirão mil vozes 

no verbo multiplicar

denuncia contra os algozes

 contra a sede de matar.

Na voz do antifascista

há gritos de Liberdade

pra que cada um resista 

e seja fraternidade.

Que no amor mais profundo

os povos sejam irmãos

para que haja Paz no mundo

com todos de mãos nas mãos.

Que nos importa que o sol

que nos dá tanta alegria

seja diferente arrebol

em cada pele que nascia.

Cada terra, continente

tem sua própria cultura.

Cada um de nós diferente

mas no espirito abertura!

Sermos quem somos, tal qual...

mas ver no que os outros são

um direito universal

em usos, religião.

Mas sempre o mesmo respeito 

deve unir um povo a outro,

desdenhando o preconceito

inventar o mundo novo!

Não ter medo de falar

de trocar opiniões

cada um de nós a escutar

as mais diversas razoes.

Mas a querer compreender 

sem nunca impor partilhar,

pra podermos ver nascer 

dia de amor a brilhar.


Por isso não há quem vença

o que morrer convencido

por cada morto apareça

um povo de olhar erguido!


Não passará o fascismo

onde couber a razão

abramos ao altruísmo

as portas do coração.

A batalha será ganha;

a Paz será a vitoria!

Esse verme, ou essa aranha

não mais entrarão na historia. 



M.G.




Meu menino na distância

uma pomba de ternura

virá sobre tua infância

numa voz suave, pura.


Meu doce terno menino

numa canção de embalar

venho dizer-te baixinho

que o sol vai nascer, brilhar.


Água fresca, transparente

virá trazer-te a beber

paz que o coração te pede

oh meu menino a crescer.



M.G.


Meu amor de olhos marinhos

onde eu queria naufragar

mas desconheço caminhos

que me levem ao teu mar.


Branco luar se desata

do teu olhar negro, escuro

como cascata de prata

a iluminar o futuro.


Navego nas tuas mãos

ardentia de desejo

entre cânticos pagãos

e a musica dum beijo.


Mas o teu olhar ternura

inunda-me novamente.

És na noite azul, escura

o contaste refulgente.


Meu amor, luz do meu dia

que outro igual amanhece

na tua pele luzidia

é que meu corpo acontece. 



M.G.



O velho trémulo

de frio caiu

entre o rebanho

está tão mudado

há tanto tempo

subindo o prado.


No lar família

aconchegada.

A voz da Emilia 

também cansada

espera o pastor.

Longa jornada

desde o nascente

ao sol a por.


A noite avança.

Uma criança 

chora no berço.

Ao canto, só

a velha avo

reza seu terço.


Um vago medo...

pressentimento?

Quem o dirá;

a noite cedo 

fecha o segredo 

escurece já.


O pastor não vem

ouve-se alguém

pedir ajuda.

A avo triste

no escuro assiste 

que povo acuda.


Hei-los em bando

trevas trepando

na serrania

na voz do berço 

sobe a do terço 

em agonia.


O pastor caído

sem um gemido

regela agora

só o latido 

do cão amigo

vai noite fora.


Como sinal

se ouve afinal

o cão ao longe.

No matagal

o povo acorre 

como quem foge.


Erguem do solo

levam ao colo

para seu lar.

Ouve-se Eolo

por toda a serra

 em frio uivar.


Chegado a casa

 à lareira em brasa 

é posto ao pé.

Chora a família

geme a Emilia

que morto o vê.


Insana lida

apenas vida 

magro sustento!

Na despedida 

na voz do cão

uiva a do vento.


Fim do cansaço

gélido abraço

o pastor estreitou.

Descai-lhe o braço

parou o passo

já descansou...


A pobre herança

de quem se cansa 

a trabalhar

é a criança

na mesma dança 

que irá girar.


Tanto trabalho

desaconchego

tanto labor...

eterna bulha

 pra encher a tulha

ao lavrador.



M.G.







Formulam-se interesses

e leis que os defendem

noções correspondem 

à tónica incerta.


Balanço quebrado

flutua também

no lago gelado

 da base de alguém.


Compõem os ritmos

exemplos, memórias

por fora das silabas 

de nossas historias.


Mas se musicais

nos falam os dias

não voltarão mais

 as vãs cotovias.



M.G.



Meu amor, sonhei contigo

mas parei entristecida

vejo em teus olhos o perigo

que condena minha vida.


Tal perigo suave fora

se abrandasses teu andar...

passaste foste-te embora

aqui fiquei a sonhar.


Levaste na caminhada

todo o tempo que era meu...

nas aos não me ficou nada

tudo de mim se perdeu.


Ficaram sete palavras

desenho a fogo d’inferno...

no meu sofrer vens e lavras

poemas no meu caderno.


Meu amor

sonhei contigo...

minha dor 

d’entontecer

sei que perdi

 meu amigo

ou não o cheguei a ter.


Meu amor

na solidão

surgiram rubros punhais

abrindo meu coração

às panteras aos chacais.


Fugiu-me o sonho de amor.

Parei à margem da vida.

Desfolhada como flor

pelo vendaval perseguida.



M.G.



A noite bate à porta.

Amargo exílio

quando o dia findou

a luz não mais transporta

o tempo que voou.


A sombra lenta vence

o dia que escurece.


Na mão do poeta adormecido

está à espera um verso

ou um gemido.

Seu olhar 

de contemplações repleto

parece serenar em sono quieto.


Mas no sono aparente

dessa visão tranquila

agitam-se fantasmas 

em saltos de arlequim.

Há vestígios marinhos

alinhando-se em fila

caminho entre escarpas 

sem chegar ao fim.


Mas o poeta dorme.

Enquanto dorme escreve

poemas corpóreos

de vozes minerais.

vê deslizar por ele

entre restos de trapo

as famélicas  fauces 

entre ervas animais.


Há um dedo estendido

como livro futuro

que nunca conseguiu.

Pálido poeta

a tropeçar no escuro

a desenhar nos ares

sons que não ouviu.

Sabe ser responsável

como se rio de tinta

navegasse veloz

entre quentes palavras.

O poeta no sonho sente 

faltar-lhe a voz

entreabre os olhos 

à procura da fala.


A um canto do quarto

há um baú d’estanho

que viera do tempo

através dos avos

baú entreaberto

para universo estranho

começo do silêncio

a espelhar-se na voz.


Há um gesto d’infância

no olhar que procura

o fazedor de versos

vai atras da verdade

a tropeçar nas rochas

a tropeçar na sombra

que formam o inicio 

de toda a eternidade.



M.G. 



Falar de ti 

dizer quem és

que percebi 

tuas marés

aonde vais

donde vieste

prantos e ais

quantos tiveste.

Quem adivinha

se há no trovão

a carga eléctrica

capaz de ser

ternura ou pão.



M.G.



 Água  pura, breve passa

pra não voltar nunca mais.

Meu grito se despedaça

navio onde está teu cais.



M.G.



Inventei outro ser. Olhos humanos

inexistentes, apenas pressentidos

andei-os soletrando em desengano

no subúrbio dos sonhos aluídos.


Talvez o fantasma transparente

deixasse atravessar em palidez

a luz vinda de longe opalescente

que no ar morno em sombra se desfez.


Ano após ano, fui construindo o dia

verídico, intenso, universal

mas o olhar que nos meus olhos via

ia  perdendo o brilho natural.


Na escuridão mais nada deslumbrava

essa visão, imagem destruída...

mas quanto mais a luz me iluminava

menos via brilhar a minha vida. 



M.G.


  

Mágica noite de encanto

donde vem a tua voz

feita de sonho, de pranto

a sombra  que é o teu manto

soluça dento de nós.


Estrelas perfumam com oiro

a nocturna solidão

o dia esconde-se loiro.

Escondeu o sol, nasce a lua

arco de castelo moiro

emoldura a noite nua.


Dançam névoas pelo céu.

O azul oriental

é o teu olhar no meu

tão escuro que me faz mal.

O mar desenha uma vela

de nau há muito distante...

de nau ou de caravela

que segue rumo a Levante.


Ondas que vêm de manso

acariciar a pele

do sonho que sem descanso

vai mis longe do que alcanço

na brancura do papel.


Meu sonho! Todo em lonjura!

Purpúrea acende-se a tarde...

se é febre, raiva ou loucura

têm a voz da ternura

que em meus olhos em ti arde.



M.G.




Numa caixa colorida

de suave tom perfumada

descobri a minha vida

em fita de seda atada.


Desfiz o no que ela tinha

dei-lhe asas, fi-la voar

vi-a partir andorinha

negro voo sobre o mar.


Desde então a minha vida

a mim nunca mais voltou.

Na areia, entristecida

espero-a ainda não poisou. 



M.G.



Fazedora de versos esquecidos

quem se lembra de mim?

Tantos versos que sentidos

foram início e o fim.


Na noite assustadora

nenhum verso me aquece

ou ilumina

o tempo dia a dia vai embora

perdeu-se da menina.


Transparente, invisível

quem me vê

Ou sabe aonde vou?

Eterno porquê 

que a vida fecundou.



M.G.



Desperto sou água mansa

desaguo no olhar

do que há em mim

da criança

que vê afundar a esperança

de novo dia raiar.


Dissipou-se entre tentáculos

em translúcida ameaça

falam distantes oráculos

prenuncio duma desgraça.


Mas vem a água fluindo

de Delfos até aqui

traz-me de Apolo esculpido

cada verso que escrevi.


Paro. Colheita de sons

de imagens de poesia.

Na hora dos semitons

há nostalgia.



M.G.

 


Falei do mar dos teus olhos

da aprendizagem do sol

vi arremessar a escolhos

o voo dum rouxinol.


Disse palavras de Verão

na surpresa do Inverno

esvaídos em tua mão

os versos do meu caderno.


A longa estrada que um dia

te viu subir para mim

era uma álea perdida

árvores de outro jardim.


Mas na distância do tempo

que nos afasta de nós

perdeu o sol o alento

que nos acendia a voz.



M.G.



Nas mãos de meu amigo

deito o rosto

de muitas madrugadas

e do medo.

Descanso os uivos internos

de luas por diluir.

Ao encontrar-me comigo

entre mãos do meu amigo

sou mais eu!

Alegre ou triste

sinto que tudo o que existe

girando em volta de nós 

espelha o mundo que persiste

na minha, na sua voz.

É nas mãos de meu amigo

que descubro a dimensão

do verso escrito em que digo

haver nos olhos do pão

esta fome que não finda

fraterna, de liberdade

numa fecunda seara

pra toda a humanidade.



M.G.



Quando havia sorrisos transparentes

como o fluir de águas de cristal

quando meus olhos eram inocentes

ingénuos do que é bem ou do que é mal

minha voz tinha o timbre de luz

saltitar de ideias movimento

agora oiço na minha voz a voz do vento

angustia de caminhos percorridos

a dor, a mesma dor

a procurar sempre uma resposta

porquê inocente doutra infância

na imposta solidão.

Tempo nascente ao sorriso do sol.

Hoje são doridos os meus passos

olhos que se negam não são meus

se a delirar por ti abro eus braços

neles sei que não terei os teus.



M.G.



Duas tranças minha avo

teve no tempo menino

seus irmãos eram crianças

as suas vozes um hino.


Os búzios vinham de longe

olhos de pai marinheiro

historias no tempo que foge

entre as águas e um veleiro.


Quase um século, um milénio

quem sabe o tempo medir?

Mais vidas oxigénio

em cada dia a fugir.


Rumo ao sul. Ou polo norte

a tarde avança fremente

levada por vento forte

transforma os outros na gente.


Mas a vida borboleta

nas tranças de minha avo

vai seguindo a linha recta

do dia de ficar só.



M.G.

                                                             pergunto ao vento que passa

                                                             noticias do meu pais.  


Lisboa anda em Paris                                        MANUEL  ALEGRE

Tejo, Sena

nem sei bem como são

a cidade repleta

do cantar do poeta

 que vai por outra mão.


São férias? Talvez não.

Este perfume estranho

é mais uma canção

ou é mais um desenho.


Colorido, cinzento?

O que sei afinal

é que nem sempre o vento

é fúria ou vendaval! 



M.G.


Eu na areia loura

olhava-te em altura.

Tu olhavas o céu

tão enorme lonjura

do teu olhar ao meu.


Eu na areia fina

o teu olhar buscava

eu, era uma menina

tu, um deus que passava.


Nos teus olhos pardos 

à cor do mar já feitos

faiscavam os dardos 

que os meus tinham  desfeitos.



M.G.


Um cisne verde

desliza sobre a erva.

Tudo é branco e azul

numa planície estranha

em dedos de água gelados.

Perto laranjais de longo gesto.



Pássaros d’água desenham a brancura

do linho rente à margem.

Pinhais azuis voadores

são início  de viagem

quando cisnes de surpresa

vêem  abrir nova cor.

Tornam-se então todos roxos

com musica de flor seca

ou de palmeira inventada.

O lago d’água invisível

perfuma a noite de treva

em cheiro matricial.

Adão Eva, nem tão pouco original.

Há um barco que procura

o cais da bruma azulada.

Quando a bruma perde a cor

o barco não é mais nada.

Desaparecem os cisnes 

cai um poema na estrada.



M.G.



Estendia-se o espaço

movimento abria novos horizontes

o tempo inexorável laço

unia os homens as fontes.

Água branda ao de leve afastava

nascente pressentida 

na força que a levava.

Essência em forma de vida

tinha estranho colorido

de passos, de mais passos

até serem vórtice ou sentido

de intermináveis traços.


Assim a água foi seguindo

sob luz vertical que a ilumina

água de minha sede Portugal

na fome de poeta e de menina.



M.G.



Aqui é o sitio do amor

se vieres bater à porta

com olhos e coração

a bagagem pouco importa

encontrarás cama e pão.


Pão cem vezes repartido

um pedaço será teu.

Pão em forno colorido

na cor que o amor lhe deu.


Bate à porta e entrarás.

Protegido contra feras.

Casa a caminho da Paz 

onde não entram panteras.


Aceita a mão que se estende!

Não está vazia! Ilusão,

mesmo se o parece entende

está cheia de coração.


Se o caminho que é da casa

atravessar o que é teu

verás a lareira em brasa

que de pronto se acendeu.


Humano irmão, não hesites

tudo o que aqui há é teu

pois nunca haverá limites 

para a luz de Prometeu.



M.G.



Não quero saber se isto que sinto

é mágoa raiva dor angustia ou morte

ao esmaecer das tinas em que pinto

o tempo sem medida eterno, forte.


Foram caindo as forças que eram minhas

até meu gargalhar escureceu.

Volto pra trás meus olhos prás tardinhas

na poalha de luz que ‘inda era eu.


Adormeceram-me os olhos coloridos

o céu azul perdeu-se rente ao mar

mas oiço ainda bater nos meus ouvidos

o mundo sem maldade por criar.


Embalada na sombra duma esperança

conheci o sentimento mais fraterno.

Há no meu peito ainda essa criança

nascida em mãos de luz no frio Inverno.


Meu canto agora é uma despedida

do mundo que existiu dentro de mim!

Ao cair morta como a ave ferida

levo meu sonho comigo até ao fim.



M.G.

Olho a paisagem invento

maré de olhar fugidia

na sombra do pensamento 

és e não és quem eu queria.


És e não és. Apareces

 ilusão dúbio sentido

nas palavras esmoreces

tempo, do tempo perdido.


Olhar de água, movimento

obscura transparência

adejar, sabor a vento

pousio de terna inocência.


Sobressalto na viagem

sem porto onde chegar.

Vou levada na voragem

de teus olhos cor do mar.



M.G.



 

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