O que ela sentia
O que ela sentia
era uma tremenda ausência
que todos os dias,
desenhava na vidraça da janela,
invadia-a um estranho torpor,
um arrepio
que vinha com a madrugada,
sombra na penumbra do quarto,
passo a passo
caminhava estendendo a mão
fria,
sabendo que na memória a sombra
se esvaía.
O que ela sentia
era um golpe de saudade
que lhe fazia bambas as pernas
e o peito murchar,
flores que há muito não via,
mar que desejou e se perdeu,
naufrágio matinal de rosas
antigas,
contas que por entre os dedos
desfiava.
O que ela sentia
era o silêncio gélido da solidão,
o ranger de tábuas envelhecidas,
cartas lidas, relidas na escuridão
e eram tantas,
tacteadas sílaba a sílaba,
meu a mor le va-me con ti go,
lábios que conhecia de cor,
sofreguidão de outrora ida
abafada em lençóis de linho
lágrimas que já não choram.
O que ela sentia
por vezes nem ela própria sabia.
Teresa Veludo
Livro Azul Liquefeito
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