Ser jovem, viver no campo
mas no campo verdadeiro.
Ter um poço um muro branco
um pomar de forte cheiro.
Ter uma pequena horta
um burro de olhos de brilho
ter em casa aberta a porta
fazer pão, ver rir um filho
ter rosas e sardinheiras
vermelhas como o sorriso.
Na sombra das oliveiras
paz de térreo paraíso;
ver à distância o pinhal
ter pinhas, juntar caruma
ver no vento o caniçal
a baloiçar cada pluma.
Escutar ao amanhecer
e no decorrer do dia
asas a enaltecer
as vozes da alegria.
Ter uma ovelhinha loura
mais uma cabra castanha
ser alegre como outrora
ágil, romântica, estranha...
ir às cores do sol poente
ou ao azul da manhã
buscar o verso veemente
cantar a vida aldeã.
Tornar a sentir-me gente.
Fraterna, amiga, pagã.
Ver na alvura da mesa
pão para ser repartido
oferta da natureza
em minha mão construído.
Ser a mesma gargalhada
expontânea, boa, sincera,
à frente ver ainda estrada
ser ainda primavera.
Dar o bom-dia a quem passa
no costume camponês
olhar o sol na vidraça
dia-a-dia mês a mês.
No dia tempestuoso
saber, na chuva inclemente
o segredo luminoso
do germinar da semente.
Ser feliz de amar a vida
ter o amor companheiro
que dá alegria à lida
à noite, o calor, o cheiro.
À lareira no serão
ouvir os contos antigos...
ao pé a família, o cão,
a voz doce dos amigos.
Ser vertigem sensual
mas com alma de menina.
Enfim, se eu tal e qual
na força de cada rima!
Marília Gonçalves
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