Alicerces
Os alicerces da
minha casa
são feitos de raízes,
raízes fundas do norte agreste
as paredes essas são socalcos de xisto,
das janelas vejo Franças e outros mundos,
nas mãos calejadas enchadas de dor,
velhos barcos navegando o vinho.
Lá onde não há relógios e o sol
marca o compasso do tempo,
as águias tudo vêem no seu voo
rasgando penhascos e montanhas altivas.
Nasci num Maio ao acaso
nas margens verdes das águas bravas,
senti o frio cortante do isolamento,
noutro tempo, outras fomes.
Já fumega o comboio, já se ouve o chiar
da bicicleta do carteiro, a corneta da carrinha do peixe,
chicharro do grande, sardinha seca,
rabos de bacalhau que é um luxo,
o Sr. Joaquim tem galinha para a menina
comer uma canja que anda desmedrada,
dizem que quer partir para longe...
que este rio não lhe basta,
sofre de tristeza e ninguém conhece a razão,
escreve versos à noitinha e chora desalmada.
Os alicerces da minha casa são raízes,
tão fundas que vão até à lonjura do mundo,
quiz ver para onde corria o rio sempre tão cheio
e saber a cor do mar onde diziam se perder,
partir, partir para lá das montanhas,
abrir o azul dos meus olhos nos horizontes
que só se abria em espanto em noites de sonhos.
Teresa Veludo
Livro No Ventre do Silêncio
Sem comentários:
Enviar um comentário