GABRIEL PEDRO (1898 - 1972)
Combatente de extraordinária coragem e rara
fibra revolucionária, bateu-se contra o regime
juntamente com o filho Edmundo Pedro,
embarcou para o Tarrafal, onde sofreu
violentos castigos na "frigideira"
e na "brigada brava". Com quatro compan
heiros, tentou uma fuga, já que tinha conhecimentos
marítimos e sabia manobrar um barco,
mas sem sucesso. Esteve encarcerado no
Campo do Tarrafal durante 9 anos, até ser abrangido
pela amnistia estabelecida pelo Decreto-Lei n.º 35.041,
de 18 de Outubro de 1945.
.
Gabriel Pedro nasceu em 22 de abril de 1898, na freguesia de Santos-o-Velho, Lisboa, filho de Marta da Conceição e de Sebastião Pedro.
Marítimo, cresceu em condições particularmente difíceis entre Lisboa e o Samouco e começou a trabalhar muito novo, nomeadamente na faina da pesca, o que muito contribuiu para um invulgar conhecimento do mar e das técnicas de navegação, permitindo-lhe, sempre que corria perigo, refugiar-se no Tejo para escapar às autoridades e à prisão.
Acompanhou e viveu as sucessivas revoltas desencadeadas entre o derrube da monarquia, em 5 de outubro de 1910, e o triunfo da ditadura militar, em 26 de maio de 1926, empenhando-se na defesa da República contra
as forças monárquicas ou fascizantes: com 12 anos, a caminho da lota de Lisboa depois de uma noite de pesca em Alcochete, presenciou as movimentações de grupos revolucionários republicanos, civis e militares, que fizeram triunfar o novo regime; em dezembro de 1917, quando fragateiro, observou o movimento militar chefiado
por Sidónio Pais; em janeiro de 1919, associou-se
às movimentações populares contra a revolta monárquica
centrada na Serra de Monsanto; em 18 de abril de 1925,
aquando da revolta militar que procurava antecipar os
tempos de ditadura, enfileirou no seu combate, reforçando
a sua desconfiança em relação ao comandante
da Polícia Cívica de Lisboa, o tenente-coronel
João Maria Ferreira do Amaral, integrando,
em 15 de maio, o grupo responsável pelo atentado
que o feriu com gravidade, sendo por intermédio
de Gabriel Pedro que Paulo da Silva, o elemento
mais procurado, se conseguiu esconder e embarcar,
em Sacavém, para França.
Depois, Gabriel Pedro envolveu-se em assaltos
de "violência revolucionária", nomeadamente
a uma ourivesaria na Rua de São Paulo, em Lisboa,
em fevereiro de 1926, fazendo com que tivesse
de partir, clandestinamente para África.
Estava já casado com
Margarida Tavares Fernandes Ervedos
o e tinha três filhos: Edmundo Pedro (08/11/1918
- 27/01/2018), João Pedro (1920-1935) e
Germano Tavares Pedro. Desembarcou em Luanda,
onde trabalhou e permaneceu vários meses, passou
por Bolama, na Guiné, e, por falta de ocupação,
seguiu para a Cidade da Praia, em Cabo Verde,
sempre de forma clandestina, reencontrando
nestes dois últimos locais vários companheiros deportados que lhe asseguraram a sobrevivência.
Ao fim de ano em meio em África, j
á sob a Ditadura Militar, acabaria por ser preso
em Cabo Verde, detetado pelas autoridades
por ter eniado dinheiro à sua mulher.
Após dois de meses de cativeiro, recebeu ordem
para regressar a Lisboa, onde tinha à espera
a Polícia de Informações, passou pelos
calabouços do Governo Civil, do Limoeiro e
do Forte de Monsanto, sendo deportado, em 1927,
para a Guiné, acusado de pertencer à Legião Vermelha.
O certo é que, enquanto marítimo conhecedor
do rio, conseguiu fugir quando estava a bordo do
navio Infante de Sagres, atirando-se ao Tejo e nadando
para um buque que o recolheu. Primeiro,
escondeu-se no Samouco, terra da mulher e,
passados uns meses, refugiou-se em Espanha,
ainda que por pouco tempo.
Com a libertação de sua mulher, presa há algum tempo,
resolveu voltar: reuniu-se à família,
trabalhava como pintor e envolveu-se em conspirações reviralhistas. Preso por denúncia, seria deportado, em inícios de maio de 1928, para a Guiné, embarcando no Gil Eanes para Bolama, onde permaneceu cerca de três anos, até ao desencadear
da Revolta das Ilhas, em Abril de 1931.
Aderiu ao movimento revolucionário triunfante
desencadeado em 17 de abril e, com a rendição
dos sublevados da Madeira e dos Açores,
Gabriel Pedro foi um dos que, mediante
um acordo assinado entre os revoltosos
da Guiné e as autoridades portuguesas,
partiu para o Senegal, tendo por destino
final Espanha: em 27 de maio, com mais
22 companheiros, embarcou de Dacar para
Las Palmas, onde chegou no vapor Doukkala,
seguindo, no Escolano, para Cádis. Com a
implantação da República em Espanha,
foi-lhe concedido asilo político, rumando
para Sevilha, onde voltou a conspirar nos
meios reviralhistas portugueses.
Após entrar em Portugal clandestinamente pela fronteira de Ficalho, fracassado o movimento de 26 de agosto de 1931, regressou a Sevilha,
onde foi descarregador no porto, trabalho
arranjado por intermédio do
Socorro Vermelho Internacional. Foi nesta
cidade que, por intermédio de Pepe Díaz,
se filiou no Partido Comunista Espanhol
e participou,
em março de 1932, no seu IV Congresso,
assim como a mulher (1) e o filho João Pedro
, este na qualidade de pioneiro.
Contactado pela delegação do
Partido Comunista Português
para ingressar na clandestinidade (2), talvez devido às numerosas prisões ocorridas na sequência dos preparativos do 1° de Maio em Lisboa, Gabriel Pedro regressou e passou a estar, formalmente, ligado àquele partido.
Na clandestinidade, manteve uma casa alugada
na Rua S. Sebastião da Pedreira, transformada
em sede central do PCP e onde se reuniam os
principais dirigentes, nomeadamente
Alfredo Caldeira, Bento Gonçalves,
Francisco de Paula Oliveira (Pavel) e José de Sousa.
Integrou o Comité Regional de Lisboa,
teve responsabilidades na Comissão Inter-Sindical
(CIS) e envolveu-se nos preparativos
do 18 de Janeiro de 1934, nomeadamente
na recolha de bombas explosivas e na realização,
em 29 de dezembro de 1933, de um comício
relâmpago na Rocha de Conde de Óbidos, de
forma a publicitar a greve junto dos operários da
Administração do Porto de Lisboa.
Na noite de 17 para 18 de janeiro,
participou nos acontecimentos de Xabregas e de Chelas,
estando previsto o assalto ao Posto da Guarda Fiscal.
Preso em 29 de janeiro
e levado para a Trafaria, cruzou-se nos calabouços
do Governo Civil com a mulher e o filho,
Edmundo Pedro, presos em janeiro de 1934
noutras circunstâncias políticas. Julgado pelo
Tribunal Militar Especial em 8 de março de 1934,
foi condenado a dez anos de degredo
e seguiu, em 8 de setembro, para Angra do Heroísmo
onde, num dos muitos castigos, conheceu a
"poterna", um cubículo húmido subterrâneo com
água sempre a pingar, mesmo no verão, onde eram
fechados os presos durante vários dias, individualmente
ou em grupo, sem qualquer agasalho, sufocados pela falta
de ar e pelo cheiro nauseabundo dos próprios dejetos.
Em outubro de 1936, juntamente com o filho Edmundo
Pedro, este vindo de Lisboa, embarcou para o Tarrafal,
onde sofreu castigos duradouros na "frigideira" e na
"brigada brava" e tentou uma fuga, já que tinha
conhecimentos marítimos e sabia manobrar um barco,
com mais quatro companheiros (3).
Abrangido pela amnistia estabelecida pelo
Decreto-Lei n.º 35.041,
de 18 de Outubro de 1945, foi libertado
em 9 de dezembro de 1945 e regressou a Lisboa,
no paquete “Guiné”, em 1 de fevereiro de 1946.
Instalou-se em Almada, trabalhou como estivador
do porto de Lisboa e, em abril de 1947, na sequência
da greve de solidariedade dos portuários
(descarregadores, estivadores e fragateiros)
com a dos operários dos estaleiros navais, assumiu
diversos projetos comerciais que, devido ao insucesso,
o levaram a ficar como contínuo da Incrível Almadense.
Participou, desde o seu lançamento, na campanha
presidencial do general Humberto Delgado e,
na sequência de uma manifestação evocativa
de Elias Garcia, em Almada, realizada em
13 de maio de 1958, voltou a viver semiclandestino
até emigrar para França, onde arranjou emprego
e fixou residência.
Teve, sempre, relacionamento respeitoso e afetivo
com os anarcossindicalistas, que conhecia desde
muito novo e com quem colaborara em diversos
atos, e continuou a sua militância política, pontuada
com divergências com militantes do Partido Comunista,
nomeadamente no Tarrafal e em França.
Em 1970, já com 72 anos, regressou a Portugal
para integrar a ARA, Ação Armada Revolucionária,
estando envolvido na sua primeira iniciativa: a
colocação de explosivos no casco do navio
«Cunene», de forma a sabotar a sua participação
na Guerra Colonial.
Faleceu em 2 de fevereiro de 1972, em Paris.
Deixou um relevante texto manuscrito,
intitulado Acontecimentos Vividos, datado
de 1 de Agosto de 1971. A viúva,
Maria Adelaide Ribeiro da Fonseca Pedro,
entregou-o ao Partido Comunista
depois do 25 de Abril de 1974
e encontra-se publicado pelas
edições avante! (2015).
Notas de HP :
(1) Ver biografia de Margarida Ervedoso em https://www.facebook.com/.../a.559109110.../888537487922298/
(2) Quando em 1931 participaram no IV Congresso do PCE que ali teve lugar, em consequência de uma intervenção de Margarida Ervedoso neste congresso, foram contactados pelo Partido Comunista Português. Convidados pelo PCP a aderirem e a tornarem-se funcionários políticos, o casal Gabriel Pedro e Margarida Ervedoso aderiram ao PCP e regressam a Portugal.
[Wikipedia]
(3) Em Memórias - Um Combate pela Liberdade,
(Editora Âncora), Edmundo Pedro descreve uma
rocambolesca tentativa de fuga do Tarrafal.
À margem da organização prisional do PCP, E
dmundo Pedro, Gabriel Pedro (seu pai),
Augusto Macedo, Tomás Rato e
Nascimento Gomes planearam uma fuga
quase ignorada na bibliografia tarrafalista [Entrevista de Edmundo Pedro ao Diário de Notícias, em 29/10/2006].
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