A pátria é nos lugares onde a alma está acorrentada.
Voltaire
Companheiros, Amigos, Leitores
Aqui estou para cumprir o que deixei dito a noite passada.
Estavam meus tios na clandestinidade e tinham com eles um filho de menos de três anos. Esse menino era muito doente, doença grave e incurável!
A mãe, era com o filho o que regra geral são as mães, extremosa e incansável, o pai de tais e extremos cuidados que a ninguém confiava o seu filho/tesouro, sou obrigada a contar que meu tio era um homem de uma ternura sem fim, que nunca passava por sua mulher sem a beijar... assim os cuidados com o filho que adorava nada têm de estranho, estava no seu carácter! Era um homem bom, atencioso e terno, como o são quase sempre os revolucionários, tanto mais que no intimo não sabem o tempo de que dispõe para apreciar o que a vida tem de bom!
Mas um terrível dia em consequência da doença, o menino morreu!Quem tem filhos, mesmo se nunca perdeu nenhum sabe no mais profundo de si o horror que isso é, para todo o sempre!
Ora como disse eles estavam na clandestinidade, com identidades criadas para o fim, e claro estavam com mais companheiros.
Ora a morte de uma criança obriga a vinda de médico a casa para constatar o óbito, naquele caso preciso seria pôr em perigo todos os que viviam naquela casa; seria poder ser descoberto. A morte atrai vizinhos, atrai curiosos do facto e por mais bem intencionados que sejam, nunca se sabe quem se encontra entre eles.
Pois por esse motivo ultrapassando heroicamente dor e desespero, minha tia embrulhou o filho morto no xaile e foi em busca dum táxi com o filho ao colo. Táxi que apanhou, pedindo ao taxista, sempre agindo como se o filho estivesse a dormir, que a levasse a Lisboa, dando para isso a morada de minha avó materna. E toda a viagem foi feita ocultando a dor, a aflição em que ia!
Quando chegou a casa da irmã, minha avó, foi a sogra desta que veio abrir. Ao ver minha tia com o menino ao colo e enrolado no xaile, disse fechando a porta: espere um minutinho vou fechar a janela está corrente de ar para a criança. Se o puderem coloquem.se no lugar da mãe, o filho morto nos braços e do espanto e horror da pessoa que tão bem intencionada tinha ido fechar a janela!
Povo de Portugal! isto são retratos do tempo do fascismo, retratos dos que se batiam pelos teus Direitos, pela tua Liberdade? Enquanto tu fingias que não vias e que nada te dizia respeito!
Como pode alguém em Portugal, alguém com sentimentos e consciência ter saudades de tal horror!
Ergam-se antes num minuto de silêncio,em respeito dos que tudo deram por vós
Seis meses depois da morte do filho, cujo funeral partiu de casa de minha avó, Alfredo Dinis o Alex era assassinado pela PIDE
Até Sempre
Marília Gonçalves
Voltaire
Companheiros, Amigos, Leitores
Aqui estou para cumprir o que deixei dito a noite passada.
Estavam meus tios na clandestinidade e tinham com eles um filho de menos de três anos. Esse menino era muito doente, doença grave e incurável!
A mãe, era com o filho o que regra geral são as mães, extremosa e incansável, o pai de tais e extremos cuidados que a ninguém confiava o seu filho/tesouro, sou obrigada a contar que meu tio era um homem de uma ternura sem fim, que nunca passava por sua mulher sem a beijar... assim os cuidados com o filho que adorava nada têm de estranho, estava no seu carácter! Era um homem bom, atencioso e terno, como o são quase sempre os revolucionários, tanto mais que no intimo não sabem o tempo de que dispõe para apreciar o que a vida tem de bom!
Mas um terrível dia em consequência da doença, o menino morreu!Quem tem filhos, mesmo se nunca perdeu nenhum sabe no mais profundo de si o horror que isso é, para todo o sempre!
Ora como disse eles estavam na clandestinidade, com identidades criadas para o fim, e claro estavam com mais companheiros.
Ora a morte de uma criança obriga a vinda de médico a casa para constatar o óbito, naquele caso preciso seria pôr em perigo todos os que viviam naquela casa; seria poder ser descoberto. A morte atrai vizinhos, atrai curiosos do facto e por mais bem intencionados que sejam, nunca se sabe quem se encontra entre eles.
Pois por esse motivo ultrapassando heroicamente dor e desespero, minha tia embrulhou o filho morto no xaile e foi em busca dum táxi com o filho ao colo. Táxi que apanhou, pedindo ao taxista, sempre agindo como se o filho estivesse a dormir, que a levasse a Lisboa, dando para isso a morada de minha avó materna. E toda a viagem foi feita ocultando a dor, a aflição em que ia!
Quando chegou a casa da irmã, minha avó, foi a sogra desta que veio abrir. Ao ver minha tia com o menino ao colo e enrolado no xaile, disse fechando a porta: espere um minutinho vou fechar a janela está corrente de ar para a criança. Se o puderem coloquem.se no lugar da mãe, o filho morto nos braços e do espanto e horror da pessoa que tão bem intencionada tinha ido fechar a janela!
Povo de Portugal! isto são retratos do tempo do fascismo, retratos dos que se batiam pelos teus Direitos, pela tua Liberdade? Enquanto tu fingias que não vias e que nada te dizia respeito!
Como pode alguém em Portugal, alguém com sentimentos e consciência ter saudades de tal horror!
Ergam-se antes num minuto de silêncio,em respeito dos que tudo deram por vós
Seis meses depois da morte do filho, cujo funeral partiu de casa de minha avó, Alfredo Dinis o Alex era assassinado pela PIDE
Até Sempre
Marília Gonçalves
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