Meio Século
No tempo em que os cavalos
Tinham patas de vento
O vôo ultrapassava a dor
E as raízes
Quando sonhos azuis
não podiam montá-los
A desenhar o sulco
De térreas cicatrizes.
No tempo em que os cavalos
não escolhiam caminho
Levantavam as crianças
Do solo atraiçoado
No tempo dos cavalos
E das imperatrizes, as leis
Eram sombra de quem ia montado.
No tempo em que os cavalos
Desenharam memória
Da cor da sua cinza
Sobre a cinza dos dias
No tempo em que o terror
Era vê-los, olhá-los
Como vento a passar sobre histórias vazias.
No tempo em que os cavalos
Numa cidade inquieta
Galopavam no tempo
Que não queria parar
Uma mancha de sangue
Desenhava-se preta
Nos dias ressequidos
A perder-se no mar.
No tempo em que os cavalos
Eram maiores que a estrada
Havia vozes cegas
Ou olhos por gritar
No tempo em que eram monstros
Que vinham dispará-los
Sobre a esperança nascida
Que não queria murchar
No tempo dos cavalos
No tempo dos cavalos
Na Pátria ia crescendo
A raiva popular.
Marília Gonçalves
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