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sexta-feira, 13 de setembro de 2024

tropeçar nos gemidos

 

Balada de saudade

balada de solidão

que corre pela cidade

como se fosse canção.


Balada dos dias idos 

balada dos dias não

a tropeçar nos gemidos

de puto que não tem pão.


Balada da mil sentidos

balada de maldição

nos dias adormecidos

nos olhos da multidão.


Balada vai pela rua

avança sem retrocesso

provocante bela e nua

chamar o povo ao progresso!



       Marília Gonçalves 

 


 
               

manhãs

 

Adeus adeus

oh perfumes de infância

oh estrelas rutilantes

por onde saltitei

a vossa fala não soa como dantes

nos meus olhos não mais vos encontrei.


Adeus adeus

sorrisos encantados

adeus adeus

se há tanto vos perdi

a estrela foge aos céus enevoados

a pomba branca não mora mais aqui.


Adeus adeus

manhãs da minha vida

agora ao entardecer

eu faço aos poucos despedida

à menina que morre por dentro da mulher.

 

 

  Marilia Gonçalves 

 


 

 

 



Nasceu o sol

 

VOZ NOS CAMPOS


HINO AO SOL





Nasceu o sol 

é de dia

com a manhã

despertou

a luminosa harmonia

que em tudo o que há

se espelhou.


é de dia

é de dia

canta, canta

a cotovia

esvoaçam os pardais

numa constante alegria

nos seus voos matinais.


Nasceu o sol

é de dia

tudo se transformou

a noite que há pouco havia

foi inundada pelo dia

que em todo o lado poisou.



Nasceu o sol 

é de dia

vida fecunda

harmonia

luz perfume, cor e tom

é de dia é de dia

o sol nasceu quente e bom.

 

                 Marília Gonçalves 




                                    

Lembrança de tua avô


                                        Ao meu querido pai



         Lembrança de tua avô


Sorriso inocente

de candura

transparente

frémito dessa ternura

na distância presente.


Sorria tua avo

à meninice alada

sorria docemente

nessa vida exilada

em que a fome é presente

e a esperança é ceifada.

    Marília Gonçalves               


 



Voa voa

 

Voa, voa

passarinho

abre as asas

pelo ar

vai seguindo 

o teu caminho

entre voar e cantar.


Voa voa

pardalito

voa pelo azul dos céus

esquece este frio de granito

diz-lhe para sempre adeus.

 

 Marília Gonçalves

 

 


 



Abílio de Guerra Junqueiro

 OBRA COMPLETA-LELLO (1 dos meus Livro de Cabeceira)

Abílio de Guerra Junqueiro            


 


Poema no Tempo Ido

Poema no Tempo Ido

 

Podia ser um poema
ou uma história de encantar
era apenas um dilema
com frases por decifrar.
 
Trazia fundos marinhos
e cores apenas sonhadas
trilava na voz dos ninhos
de primaveras passadas.
 
Talvez fosse devaneio
ou algo a concretizar
com olhar de corpo inteiro
intempéries no olhar.
 
Mas sonhos são poço fundo
onde se espraia o luar
Circes e deusas do mundo
esgarçavam o seu cantar.
 
Ai de mim de longe venho
perdi o velho caminho
com águas da cor de estanho
e perfume a rosmaninho.
 
surgiram numes, poetas
paisagens de apetecer
mas tinham falas secretas
do que nunca chega a ser
 
um remoinho de treva
afundou-se no meu pão
misto de trigo e de esteva
mordendo o meu coração.
 
Marília Gonçalves 
 

 



João de Deus POETA S. Bartolomeu de Messines- Algarve

 

João de Deus

                       João de Deus

 

AQUI 

 Em 1895, foi organizada uma grande homenagem ao poeta à qual se associou o Rei D. Carlos. Foi-lhe proposto um título nobiliárquico, que recusou. A Academia Real das Ciências proclamou-o Sócio de Honra.

Em resposta à homenagem de estudantes de todo o país que se dirigiram a sua casa em grande cortejo, João de Deus assomou à varanda e declamou de improviso:


Estas honras e este culto

Bem se podiam prestar

A homens de grande vulto.

Mas a mim, poeta inculto,

Espontâneo, popular...

É deveras singular!


                                                         João de Deus

 

Oceano oceano

 

Oceano azul escuro

mergulhou a noite em ti

quanto mais te procuro

mais tu te afastas de mim.


Oceano de tormenta

onde minha dor caiu

na minha alma sedente

está o amor que fugiu.


Oceano de queixumes

do mar da minha saudade

meu peito maré de lume 

onde gemes à vontade!


Oceano verde verde

onde a manhã mergulhou

meu olhar a sombra perde

dessa luz que em ti brilhou.


Oceano oceano

não voltes à escuridão

não queiras causar mais dano

negando-me coração.



   Marilia Gonçalves 


                                        

                                   Oceano Atlântico e Pacífico não se misturam

Meu país é um poeta

 

Meu país é cotovia

a cantar sonhos de alguém

entre dor e nostalgia

da terra que é nossa mãe.

 

Meu país é uma cigarra

ou um grilo cantador

na sua voz desgarra

esperança num dia melhor.

 

Meu país é um poeta

su’alma saudosa ainda

trás nele uma porta aberta

à fraternidade infinda.

 


                                 Marilia Gonçalves 

 


 

 

 

 

solo que é português!

 

Parti pra terras distantes

quem sabe se voltarei

a se a mesma que dantes

na terra onde me embalei.


Fui à procura do pão

a correr atrás da vida

mas não esqueci o meu chão

a minha infância perdida.


Parti parti pra tão longe

ah dia de regressar

do pensamento não foge

essa ideia a acenar.


Talvez um dia quem sabe

eu possa voltar de vez

que este meu amor só cabe

no solo que é português!

 

 

Marilia Gonçalves 

 


 




Vai-te embora

 

Dorme dorme meu menino

dorme dorme dorme bem

vai dormindo

vai dormindo

nos braços de tua mãe.


Vai-te embora, medo medo

vai-te embora donde estás

vai nas névoas dum segredo

que nunca se saberá.


Vai-te embora medo medo

vai por ai na escuridão

vai por entre o arvoredo

espalhar sombras pelo chão.



Marilia Gonçalves 

 


 



o mar da tua sede

 

Vai no bote o pescador

o bote vai pelo mar

na rede da tua dor

que sonho irás apanhar?


Vai o pescador pelas águas

profundas, na escuridão

pescador não pesques mágoas

tu precisas é de pão.


Treme o bote, treme, treme

sempre, sempre a baloiçar

o lobo do mar mais teme

a miséria que o esforçar.


Nas malhas da tua rede

nos anzóis que largas fundo

escorre o mar da tua sede

na fome que há pelo mundo.

 

Marilia Gonçalves