Páginas

Páginas

Páginas

Páginas

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

Marília Gonçalves e o Poema O Relógio da Torre

 Marília Gonçalves (née en 1947) a vécu de longues années entre son Algarve natal et la France, où elle arrive pour la première fois en 1962. Ses premières lectures (entre autres, celle du poète brésilien abolitionniste Castro Alves) n’ont fait que consolider en elle une éducation familiale fondée sur des valeurs telles que la fraternité et la liberté, thèmes récurrents de sa poésie. A participé dans de nombreux récitals, militante politique anti-salazariste, Marília Gonçalves fut aussi une animatrice assidue de la première radio libre franco-portugaise de la région parisienne, Radio Club Português, dans les années 80. En 1991, les éditions ACAP 77 publient à Paris son premier recueil de poèmes intitulé « À procura do Traço » et tout récemment en juin 2006, Marília Gonçalves a reçu le 1° prix « Dar voz à poesia », organisé par la Mairie de Ovar (région de Aveiro) pour son poème o « Relógio da Torre ».


       O Relógio da Torre


Para quê saber o fundo da angústia

este uivo vendaval que cedo surpreende

para quê conhecer a hora da argúcia

quando voam gaivotas sobre corpo de sede.


Remoinhos nos olhos levantam pensamentos

onde folhas de Outono poisaram tristemente

o cofre das lembranças e o de sentimentos

deixam voar saudades a desfazer-se sempre.


Só uma badalada no pêndulo da torre

por uma hora magra, breve que nos resta

enquanto sobre nós cada dia que morre

na espessura da noite vai cobrir a floresta.


O cantar de sereia vem do tempo de Ulisses

ou navio que se afasta na estridência do cais

a navegar a bruma duma ilha de Circe

no rouco som que parte para não voltar mais.


O perfume de Agosto sobe do fim do tempo

com risos a cantar e manhãs a nascer

mas são vozes do cofre, que estão em movimento

ou retratos antigos a chegar pra nos ver.


Tudo quanto nos cerca tem o tom conhecido

da constante paisagem do que somos na vida

como oferenda eterna do eco pressentido

no timbre cor de mel que nos serena ainda.


Minutos de surpresa e continua a espera

vertigem de viagem no encontro dos dias

mesmo se o mês de Outubro nos cheira a Primavera

vão pairando no ar as velhas sinfonias.


A mão que nos segura, vacilando fraqueja

o tempo tem limite, tem portas e fronteiras

o instante sereno que nosso alento beija

vai desfolhar a flor de nossas sementeiras.


Somos ainda sol amarelo de Verão

uma praia aquecida no acaso da tarde

uma palavra solta na voz duma canção

uma fímbria de luz na breve imensidade.


Uma certeza só, perdida, inviolável

que nada trairá nem poderá vencer

o encontro perene de olhar inevitável

vestido de distância, mas que nos faz doer.


O solitário apito, um chamamento apenas

acena-nos de leve a esperada viagem

e nossas pobres forças, humanas, tão pequenas

vão subir o degrau da última coragem.

Sem comentários:

Enviar um comentário

O seu comentário espera moderação