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segunda-feira, 14 de março de 2011

Eugénio de Andrade - Poesia

viver em poesia
             
              O lugar da Casa

        Uma casa que fosse um areal
        deserto; que nem casa fosse;
        só um lugar
        onde o lume foi aceso, e à sua roda
        se sentou a alegria; e aqueceu
        as mãos; e partiu porque tinha
        um destino; coisa simples
        e pouca, mas destino:
        crescer como árvore, resistir
        ao vento, ao rigor da invernia,
        e certa manhã sentir os passos
        de abril
        ou, quem sabe?, a floração
        dos ramos, que pareciam
        secos, e de novo estremecem
        com o repentino canto da cotovia.

                           Eugénio de Andrade

É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.

É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.

É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer. 

                               Eugénio de Andrade




Eugénio de Andrade - Abril



Brinca a manhã feliz e descuidada,
como só a manhã pode brincar,
nas curvas longas desta estrada
onde os ciganos passsam a cantar.
Abril anda à solta nos pinhais
coroado de rosas e de cio,
e num salto brusco, sem deixar sinais,
rasga o céu azul num assobio.

Surge uma criança de olhos vegetais,
carregados de espanto e de alegria,
e atira pedras às curvas mais distantes
- onde a voz dos ciganos se perdia. 

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