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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

A pátria é nos lugares onde a alma está acorrentada.
Voltaire



MONSARAZ

 
No pó estão impressos os passos

dos velhos guerreiros cansados.

Ninguém os vê, mas sabe-se

que dormem atrás das muralhas.

São de vidro os olhos fundos

das velhas sentadas

com os dedos retorcidos em riste

--velhos fusos fiando a lã dos séculos.

Ninguém viu a face austera

do Grande Senhor,

mas ele está presente

com um azourrague de medo

atrás de cada oliveira.

Tudo está conforme - o pelourinho, a missa

na Igreja Matriz, o fantasma

de Nun'Álvares rindo na cal do muro

e o açoite no servo

que faltou ao tributo.

E quando o Sol se esconde

lá longe, onde ninguém sabe,

as velhas diluem-se no escuro

e os olhos das corujas

tomam conta da noite.

O vento circula repetindo-se

entre o Castelo e o sino

em rodopios de bronze.

Soam badaladas de fome

à medida que os braços caem.

Um a um, os homens sacodem

a teia de aranha

e partem, de manhã,

rolando como pedras pela encosta

em busca duma esperança.

Monsaraz resiste, imperturbável,

no alto do silêncio

e os homens, que regressam assustados,

entram furtivos e descalços

para não acordar o tempo.


Carlos Domingos

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